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A deputada Janaina Paschoal (PSL-SP) quer erradicar os casos de abuso sexual em creches e pré-escolas paulistas. Mas de um jeito controverso: através do Projeto de Lei 1.174/2019 , que delega cuidados íntimos de crianças como banho, troca de fralda e roupa e auxílio no banheiro exclusivamente às profissionais mulheres.
Profissionais homens não estariam autorizados a desenvolver atividades que estimulem a aquisição de hábitos de higiene e saúde pelos alunos. A regra valeria mesmo no atendimento de estudantes com necessidades especiais, que podem precisar de limpeza de sialorreia (secreção abundante de saliva).
A proposta é direcionada à educação infantil , primeira etapa da educação básica que acolhe crianças de 0 a 3 anos em creches e de 4 e 5 anos em pré-escolas. Mas vai além. Nos anos iniciais do ensino fundamental, os profissionais do sexo masculino também não poderiam acompanhar as crianças no banheiro, em caso de necessidade.
O que os homens poderiam fazer? O projeto permite que eles realizem atividades pedagógicas e outras que não sejam relacionadas a cuidados íntimos, de acordo com o que for compatível com o cargo. Não é prevista alteração no salário.
A proposta 1.174/2019 está em tramitação na Assembleia Legislativa de São Paulo e foi idealizada pelas deputadas estaduais Leticia Aguiar e Valéria Bolsonaro, além de Janaina Paschoal. Todas são filiadas ao PSL.
Uma colega de plenário, Monica Seixas (PSOL), da Bancada Ativista, propôs um substitutivo para que as atividades indicadas no Projeto de Lei sejam desempenhadas por qualquer profissional qualificado e habilitado, independentemente do gênero.
Além disso, determina que os municípios poderão promover a identificação de abuso sexual e campanhas sobre cuidados íntimos das crianças para os profissionais que atuam na educação infantil, assim como requisitar que as escolas incluam o combate ao crime em seus Projetos Políticos Pedagógicos.
O projeto do PSL surgiu como resposta a mães e pais de escolas públicas de Barretos , Araçatuba e outras cidades paulistas. Eles temiam que seus filhos se tornassem vítimas de abuso sexual a partir da contratação de homens para a atuação na educação infantil. Até então, não haviam sido registradas ocorrências do crime na rede municipal.
Segundo Janaina Paschoal, o objetivo do Projeto de lei é dar segurança às famílias. “Muitas mulheres carentes estavam considerando deixar seus empregos para não entregarem seus filhos pequenos aos cuidados de homens”, explica ela em entrevista ao Desafios da Educação .
Janaina Paschoal: criadora do PL 1.174/2019. Crédito: Assembleia Legislativa de São Paulo/divulgação.
O temor dos pais e das mães é respaldado por dados oficiais – mas apenas em parte.
Uma análise epidemiológica a partir de dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde, mostrou que, entre 2011 e 2017, 31,5% dos 184.524 casos de violência sexual foram contra crianças.
Entre as vítimas do gênero feminino (74,2% do total), 51,9% estavam na faixa etária entre 1 e 5 anos. O agressor foi um homem em 80,8% das ocorrências.
O medo é justificado até esse ponto, mas não quando se trata do local de ocorrência do crime. Os abusos ocorreram na residência da criança em 71,2% dos casos, enquanto 3,7% foram na escola.
Ainda segundo informações divulgadas pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos os abusadores mais comuns em 2018 foram mães, padrastos e pais (70%), nesta ordem.
Viviana Santiago, em palestra. Crédito: Youtube/Reprodução
Viviana Santiago, gerente de gênero e incidência política da ONG Plan International – que defende os direitos de crianças, adolescentes e jovens –, declara-se incomodada pela insinuação feita na lei de que todos os homens são possíveis violadores e abusadores.
“O abuso é cometido por um abusador, não por qualquer homem. Esse projeto traz a leitura que todo homem é capaz de abusar e criminaliza a existência dos homens que atuam como profissionais da educação”, critica Santiago.
Paschoal diz que a intenção não é negar a existência de mulheres abusadoras, tampouco dizer que todo homem é abusador. “Eu prefiro proteger crianças a ser politicamente correta”, afirma.
A deputada diz que sempre defendeu a divisão dos cuidados dos filhos entre pais e mães, mas que a situação deve ser diferente na educação infantil como medida de prevenção. Para ela, a aprovação do PL evitaria riscos às crianças e também aos próprios profissionais, que estariam sujeitos à desconfiança por parte dos pais ou responsáveis.
Paschoal conta que um profissional entrou em contato com ela dizendo que havia pedido exoneração do cargo na educação infantil por não se sentir seguro durante os cuidados íntimos das crianças.
“Ele me escreveu dizendo que não gostaria que um homem desse banho nos seus filhos e, por isso, se negou a desempenhar tal atividade, sofrendo consequências administrativas, até mesmo uma sindicância”, relatou.
Já para a gerente de gênero e incidência política da ONG Plan International, o projeto reforça a ideia de que o cuidado às crianças é papel das mulheres. “Interditar o acesso desses homens faz com que se interdite o direito deles de exercer o cuidado.”
Na proposta, as autoras questionam: como garantir que a família não vá interpretar um ato corriqueiro na higienização (limpeza das partes íntimas, por exemplo) como um abuso, diante do relato da criança?
Santiago sugere que desde cedo as crianças sejam protagonistas da sua própria proteção ao aprenderem a identificar abusos e nomear as partes do corpo. “Falar abertamente desses casos para que o olhar das pessoas fique treinado é muito mais eficiente do que simplesmente interditar a presença dos homens.”
Por Larissa Pessi
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