As vivências de Thuinie Daros e Fausto Camargo como professores – inclusive, durante a pandemia – serviram de combustível para a criação de duas obras que retratam os desafios e propósitos dos docentes contemporâneos.
Nos livros “A Sala de Aula Inovadora” e “A Sala de Aula Digital”, ambos publicados na série Desafios da Educação pelo selo Penso, os autores aprofundam o conceito de inovação em escolas e instituições de ensino superior.
Afinal, de contas, como alinhar as estratégias pedagógicas ao cotidiano de alunos nativos digitais? Essa é uma das perguntas que Daros e Camargo respondem na entrevista abaixo, em um bate-papo sobre a construção dos seus trabalhos e as perspectivas para a educação do futuro.
A transformação digital da sala de aula é inevitável. Em que momento isso ficou claro para vocês?
Thuinie – Precisamos observar o contexto social de forma mais ampla. Há desafios e problemas mundiais surgindo. A grande solução para isso é o advento das tecnologias.
Fausto – Se pensarmos em como a tecnologia vem sendo incorporada no cotidiano, naturalmente, isso aconteceria com a educação em algum ponto. Essas evidências estão aparecendo há uns dez anos. Algo que só se acentuou com a pandemia.
Thuinie – Então, vimos que uma sala de aula digital vai de encontro a essa transformação, pois possibilita que estudantes, professores e gestores consigam acompanhar e personalizar o processo de aprendizagem.
Fausto – Porém, vimos ainda uma certa resistência em algumas instituições educacionais sobre a internet em sala de aula. Mas não há outra saída. É necessário aprendermos a lidar com esse ambiente mais aberto e utilizá-lo ao nosso favor.
A sala de aula digital não é abandonar o conceito de presencial e apenas ficar no ambiente virtual. É ter um aparato tecnológico que dê suporte para que seja possível otimizar mais a educação e intensificar o ensino. Tudo isso sem esquecer da finalidade principal: a aprendizagem do estudante.
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Esse entendimento já está na visão dos professores e gestores atualmente?
Thuinie – A preocupação já está presente. Não é à toa que há grandes legislações trazendo essa discussão, como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação, entre outras.
Fausto – Realmente, há cada vez mais uma aderência a essa ideia sim. Porque a tecnologia está em todo lugar. Se não nos atualizarmos, seremos atropelados. Todos estão procurando soluções e saídas para, cada vez mais, integrarmos essa nova realidade nas instituições. A grande questão é como fazer isso.
Thuinie – A verdade é que a tecnologia em si é um produto humano. Nós, como educadores, precisamos garantir todo esse conhecimento produzido dentro das instituições de ensino. Isso está diretamente ligado à função social do professor. A sala de aula digital pode ser um desafio por conta da desigualdade brasileira. Porém, ela não deixa de ser uma discussão pertinente dentro do nosso momento histórico.
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Quais problemas atualmente as salas de aula possuem que mostram a necessidade de uma inovação no ensino?
Thuinie – De modo geral, os professores relatam uma dificuldade em capturar a atenção dos alunos e mantê-la durante as aulas. Isso levanta um questionamento: os estudantes estão perdendo sua capacidade de prestar atenção, devido ao excesso de tela, ou será que são as nossas metodologias o problema?
Fausto – A partir desse questionamento, temos que primeiro entender o aluno e procurar entregar para ele o que é importante. Se formos pensar do ponto de vista de geração, temos uma renovação de hábitos e ideias das pessoas em ciclos, por exemplo, de dez anos.
Thuinie – Os estudantes dessa geração possuem uma atenção mais sofisticada, ela não se volta mais para qualquer lugar, por conta dos estímulos atuais. Esse processo justifica a necessidade de uma sala de aula mais conectada e relacionada ao contexto atual.
Fausto – Temos hoje o aluno que é nativo digital, que possui necessidades específicas. Não é inteligente eu querer forçar a barra para um lado se o aluno me mostra que possui uma outra forma de aprender. Portanto, se ele utiliza a tecnologia no dia a dia, eu também preciso utilizá-la na sala de aula.
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No livro, vocês listam 42 estratégias pedagógicas pautadas em metodologias ativas para renovar as salas de aula digitais e híbridas. Como chegaram a essas ideias?
Thuinie – Nós somos docentes. Fazemos formações por todo o Brasil, buscando ajudar professores a se prepararem para os alunos de hoje e suas singularidades. Estávamos em um cenário pandêmico quando começamos a escrever o livro, mas já observamos o movimento de uma educação mais digital, independentemente da modalidade.
Já tínhamos o livro “A sala de aula inovadora”, que contém estratégias para contextos menos digitais. A partir da chegada da crise sanitária, começamos a perceber as necessidades pertinentes àquele momento, como captura da atenção, tecnologias, etc.
Fausto – Como essas 42 estratégias vem da nossa vivência enquanto docentes e nós apenas as condensamos, os professores já pegam essas ideias mais construídas. Durante a pandemia, nós continuamos a nossa rotina de trabalho testando possibilidades.
Thuinie – Com tantos meios disponíveis, percebemos que havia uma necessidade de fazer a sistematização dessas experiências. Com isso, fornecer auxílios aos professores. Todas as estratégias são testadas, várias são criações nossas, outras são adaptadas. É por essa razão que elas são funcionais e versáteis.
Fausto – Por exemplo, temos uma estratégia chamada de youtuber. Não quero que o estudante siga essa carreira. O propósito é que ele desenvolva capacidade de argumentação, de falar e interagir diante de uma câmera. Ao mesmo tempo em que eu o instigo a aplicar conhecimentos técnicos daquela área, incentivo o desenvolvimento das soft skills.
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Como uma sala de aula inovadora pode auxiliar na interação dos alunos entre si e com os professores?
Thuinie – Hoje, a sala de aula deixou de ser apenas um espaço onde os alunos vão presencialmente. Ela passou a ser qualquer lugar onde se desenvolve a aprendizagem. Quando os professores passam a estar conectados por um propósito, acaba sendo construídas interações mais ricas e educativas. Isso independente do contexto, seja presencial ou a distância.
Fausto – Existem diversas pesquisas que já trazem constatações sobre isso. Por exemplo, sabemos que as ferramentas digitais podem otimizar o tempo do professor entre 20% a 30%. Também já sabemos que mais de 70% dos jovens com mais de 16 anos sabem que a aprendizagem vai incorporar cada vez mais o uso de ferramentas digitais.
Existe uma integração entre o online e o offline. Independentemente do local, seja presencial ou virtual, a sala de aula é digital. A aprendizagem acontece a partir da interação. E usar as ferramentas digitais não irá eliminar esse processo. Muito pelo contrário, irá potencializá-lo com o uso de ferramentas.
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Quais os principais resultados, a curto e longo prazo, da inovação dentro das salas de aula?
Thuinie – A curto prazo, haverá uma melhora significativa na participação dos estudantes e na qualidade das interações. O aluno percebe quando existe um planejamento, a aprendizagem perpassa pelo estabelecimento de vínculos. Uma proposta de ensino voltada para as necessidades dos estudantes tende a motivá-los. Logicamente, os ganhos a longo prazo são o desenvolvimento das competências e habilidades mais amplas. O aluno não apenas vai adquirir o conhecimento, mas também vai aplicá-lo de maneira consciente, agregando a sua cidadania.
Fausto – A educação há dez anos era um cenário totalmente diferente. No futuro, quem sabe dez anos também, será outro cenário completamente inédito. Teremos mudanças transformadoras e significativas. Precisamos caminhar para uma inovação que consiga de fato desenvolver pessoas capazes de ter autonomia e aprender por si só. Precisamos de uma educação que consiga avançar, independente da sua modalidade.
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A inovação está apenas relacionada à tecnologia ou também trata de outros aspectos?
Fausto – Inovação na educação envolve aspectos mais globais. A tecnologia é um dos pilares, mas sozinha não resolve nada. Precisamos ainda do planejamento dos professores, para personalizar a aprendizagem do estudante.
Thuinie – Não é um recurso em si. O maior ativo do professor da contemporaneidade é o domínio de estratégias e recursos que ele possui. Pensando nisso, a tecnologia pode ser usada para fomentar a inovação.
Fausto – Contudo, precisamos ultrapassar a ideia de formar as pessoas apenas profissionalmente. Temos que desenvolver seres humanos decididos, comunicativos, entre outros aspectos importantes para a sociedade do futuro. As ferramentas tecnológicas estão aí para auxiliar nisso e no crescimento do aluno profissionalmente.
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