Ensino Básico

Objetivo da escola deve ser a realização pessoal, afirma Marc Prensky

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Você lembra quantos anos tinha quando usou um computador pela primeira vez? E como foi a experiência com o seu primeiro celular? Provavelmente, essas foram experiências marcantes. A menos, é claro, que você seja um nativo digital.

Esse termo, “nativo digital”, foi criado pelo professor americano Marc Prensky. Trata-se de uma expressão usada para designar as pessoas que nasceram e cresceram em contato com as últimas tecnologias. E que não deveriam frequentar aulas ministradas de acordo com os antigos métodos de ensino. “Agora é o momento para uma nova forma de educação, baseada no empoderamento”, afirma Prensky.

À frente da Fundação e do Instituto da Global Future Education, Prensky, 77 anos, é palestrante especializado em educação e autor de livros como Educação para um mundo melhor: como estimular o poder das crianças e jovens do século XXI (2021) e Aprendizagem baseada em jogos digitais (2012). Na entrevista a seguir, concedida com exclusividade ao portal Desafios da Educação, o autor discorre sobre as novas gerações – e as melhores práticas de ensino e aprendizagem.


Uma das suas ideias é a de que as escolas, ao invés de utilizarem o sistema tradicional de educação, dividido em séries e anos, organizem a trajetória acadêmica por hubs e projetos. Qual seria o impacto disso em termos de aprendizagem?

Muitas vezes, pensamos de forma equivocada que o principal objetivo dos jovens é aprender. E não é. O objetivo real é a realização. Aprender é apenas um meio de obtê-la. Antigamente, as crianças eram criadas com base na imitação: os pais mostravam aos filhos; os mestres, aos aprendizes. Isso tudo levou a muitas cópias.

Então, apareceram algumas pessoas que disseram: “Esperem! Pensar é importante” e criaram as universidades e disciplinas para aprender. Isso levou apenas a uma valorização do pensamento e ao aprendizado, com o abandono completo da realização. A tradição acadêmica – sem a realização – tomou conta de todas as nossas escolas.

Agora é o momento para uma nova forma de educação, baseada no empoderamento.

Esse conceito combina a realização com o aprendizado conforme necessário – não com antecedência, mas em um processo contínuo. Esse novo sistema prepara as crianças para o futuro. Nele, toda pessoa jovem continuamente realiza coisas com as quais se importam e que amam fazer, aprendendo o que precisam nesse processo.

Nós precisamos desse novo sistema porque o atual toma muito tempo e não funciona para todos. Em muitos lugares hoje a juventude é metade da população e representa uma força de trabalho potencial. Ao contrário do que ocorria no passado, hoje nós podemos ajudar a população jovem a se realizar sem explorá-la. Porque a realização no nosso novo mundo é muito menos física e muito mais intelectual. Então, nosso atual objetivo deve ser para que os estudantes não apenas aprendam, mas se realizem no mundo real.


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Atualmente, as avaliações são baseadas em pontuações e rankings. Você, ao contrário, propõe uma análise que leve em consideração o impacto do aprendizado. Na prática, quais seriam as possíveis alternativas às provas e aos exames tradicionais?

Colocar os estudantes em um ranking é uma ideia terrível. Isso surgiu no exército como uma maneira de “colocar o melhor no topo”, mas é algo incompleto e destrutivo. Rankings podem até mesmo matar – em alguns lugares, crianças cometem suicídio por conta de notas e rankings acadêmicos. Não há nenhuma necessidade disso.

Uma vez que aceitemos a realização como nosso objetivo, todas as tarefas cumpridas devem ter um impacto positivo mensurável em algum aspecto do mundo. Aí está um método bastante simples e “métrico” de avaliação: “antes e depois”. Você precisa estar pronto para apontar alguma coisa e dizer “viu isso? Antes, não estava tão bom (ou não existia). Agora, por causa do que o nosso time fez, está muito melhor, como você pode ver”.

“Melhor” pode ser um conceito quantitativo ou qualitativo, mas precisa ser um acordo em comum.  Mas não há necessidade de tentar avaliar “quanto melhor” uma coisa é do que outra, e classificar realizações que provavelmente são impossíveis de fazer. Nós só queremos que o maior número possível de coisas seja melhor como resultado do que nossos jovens fazem.

Individualização e personalização do currículo são ideias que estão crescendo nas escolas e nas universidades. Os diplomas mudarão com isso?

Os diplomas, de qualquer tipo, são conquistas, não realizações. Isso, porque eles não mudam nada no mundo por si mesmos. Eles nem mesmo preparam os jovens para a realização – com algumas poucas exceções, como as escolas técnicas.

Diplomas são antiquados e uma maneira muito reducionista de mensurar o que alguém fez.

Eles são, em geral, credenciais ruins. O que diplomas realmente indicam é que – porque você foi admitido e passou por uma certa escola – você faz parte de um grupo social ou intelectual particular. Eles precisam acabar (mesmo que isso não deva acontecer tão cedo).

O que é muito mais útil para um empregador, por exemplo, não é um diploma, mas um resumo de realizações certificado. É por isso que eles estão procurando – e não por cursos e diplomas, que não mostram nada sobre esses feitos.

Mesmo um “currículo personalizado” de cursos que alguém fez e “passou” diz muito pouco aos empregadores. O currículo (com realizações muito específicas e resultados numéricos) é tudo o que empresas modernas como o Google exigem.

Você fala muito sobre estudo sob demanda e baseado em projetos. Acredita que crianças e adolescentes possuem os requisitos necessários para escolher como aprender?

O maior erro no sistema educacional é a ênfase no aprendizado como um objetivo e acreditar que ter sucesso na criação de crianças diz respeito apenas a seu aprendizado. Os jovens raramente dizem por conta “eu quero aprender”. Ao invés disso, falam “eu quero fazer tal coisa”. Se precisarem aprender algo para conseguir fazer o que querem, eles aprendem. Por exemplo, para ir bem nos videogames ou nos esportes, é necessário aprender muito.

Mas eles não aprendem a maior parte das coisas com que se importam de maneira prévia, na sala de aula, mas enquanto buscam realizar seu objetivo. Aprender não é quase nunca um objetivo por si (exceto, possivelmente, para alguns professores e acadêmicos). Para a maior parte da humanidade, aprender é um meio. A propósito, outro meio de tornar o aprendizado mais divertido e menos óbvio e tedioso é a “brincadeira”, que as escolas geralmente não consideram muito favoráveis.


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