O Brasil está entre os países com mais advogados no mundo: são 1,2 milhão de profissionais do ramo. Ou seja, um advogado a cada 174 habitantes – densidade superior aos EUA, cuja proporção é um a cada 246 pessoas, e ao Reino Unido, com um a cada 354.
Há muitas razões para essa realidade. Uma delas é a expansão acelerada de cursos de Direito. De 2018 a 10 de abril de 2019, 52 mil novas vagas em graduações em Direito foram criadas no país, chegando a um total de 313 mil. O aumento foi de 20% no período. As vagas estão distribuídas em mais de 1.500 cursos.
A partir de uma perspectiva histórica, é possível analisar o impacto – e o tamanho – dessa expansão. Segundo levantamento do jornal Folha de S. Paulo, de cada 100 vagas disponíveis desde 1828 (quando foram fundadas as primeiras faculdades de Direito no Brasil), 16 foram criadas nos últimos 15 meses. Os dados são do Ministério da Educação (MEC).
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O que favorece a disparada
O movimento é fruto das regras mais flexíveis para a abertura de novas vagas em cursos de Direito, instituídas em 2018 pelo então presidente Michel Temer. Uma das normas revistas foi a exigência do Conceito de Curso (CC) de ao menos 4 (em escala de 1 a 5) e parecer favorável da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), salvo em casos excepcionais de cursos com conceito 5. O parecer passou a ser opinativo para abertura de novas vagas.
Assim, a demanda de abertura pelas faculdades, que havia sido represada, avançou. Só em 2018 foram criados 322 cursos de Direito, o que significou 44,7 mil vagas.
A gestão Jair Bolsonaro manteve as normas e, nos primeiros 100 dias de governo, criou outras 7.682 vagas em Direito.
Esses números podem crescer ainda mais. Reportagem publicada no jornal O Estado de S. Paulo revelou, nesta segunda-feira (22), que o MEC promoveu um “mutirão” nos primeiros meses do ano para acelerar a abertura de novas universidades no país.
Entre janeiro e abril deste ano, o MEC encaminhou para análise do Conselho Nacional de Educação (CNE) 120 processos de credenciamento de novas instituições de ensino superior (IES). Boa parte desses processos estavam parados há anos no MEC – apenas 5% foram protocolados em 2018.
O número total de processos enviados entre janeiro e abril ao CNE é 70% maior do que o registrado no mesmo período do ano passado, quando o ministério enviou 71 processos. Dos 120 processos de 2019, apenas dez tiveram avaliações desfavoráveis no CNE. O parecer favorável é o primeiro passo à homologação da IES pelo MEC.
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Empregabilidade é desafio no Direito
Em janeiro deste ano, a OAB, que é tradicionalmente contrária à proliferação de cursos de Direito, enviou um ofício ao MEC pedindo que a abertura de vagas fosse suspensa por cinco anos – à semelhança da portaria que suspendeu a publicação de novos editais para criação de cursos de Medicina, em 2018.
A OAB sustenta que o Brasil não comporta mais cursos na área e que as novas vagas não atendem aos padrões de qualidade. Nos últimos três anos, a OAB deu aval a apenas dois de 652 pareceres para autorização ou renovação de graduações em Direito. Dos 1.500 cursos existentes, só 161 receberam o selo OAB Recomenda, espécie de certificação da entidade.
A OAB também acusa os chefes do MEC de usarem a aprovação dos novos cursos como moeda de troca política.
Ao jornal Folha de S. Paulo, o presidente em exercício da OAB, Luiz Viana Queiroz, questionou a perspectiva profissional dos futuros formados. No último exame da ordem, que autoriza o exercício da advocacia, a aprovação não superou os 16%. “É um estelionato que se faz com os alunos e suas famílias”, afirmou.
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