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Duas décadas atrás, a compreensão sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) ainda era bastante limitada. Com uma triagem tardia e baseada exclusivamente em observação comportamental, poucas famílias tinham acesso a serviços especializados. Como consequência, vários adultos permaneceram sem diagnóstico durante a vida toda, sobretudo aqueles com quadros mais leves.
Em 2025, a realidade é outra. O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, Quinta Edição (DSM-5), da Associação Americana de Psiquiatria, consolidou a definição unificada de TEA, estabelecendo critérios mais claros para o diagnóstico clínico.
A coleta de dados também evoluiu — inclusive no Brasil. Pela primeira vez, o Censo Demográfico trouxe dados sobre autismo, apontando que 2,4 milhões de pessoas são identificadas com o transtorno.
Atento a esse novo cenário, o selo Penso, do Grupo A, lança, no final de agosto, a segunda edição de Autismo e Educação, obra de referência publicada originalmente em 2002. Com organização de Cleonice Alves Bosa e Carlo Schmidt, psicólogos com sólida atuação na área, o livro compila artigos de diversos especialistas, que ajudam a compreender e transformar a experiência de aprendizagem de alunos com TEA.
Trata-se de uma obra com base científica profunda e abordagem prática, que acompanha grande parte da trajetória educacional de pessoas com autismo. Esse novo olhar se reflete até no subtítulo: o antigo, “Reflexões e Propostas de Intervenção”, foi substituído por “Da Educação Infantil ao Ensino Superior”, evidenciando como a inclusão avançou nos últimos 20 anos.
Nos últimos anos, a atenção ao desenvolvimento das pessoas com diagnóstico de autismo voltou-se em grande parte para a área educacional. Em 2012, a Lei nº 12.764 — que leva o nome de Berenice Piana, militante e mãe de um filho com TEA — estabeleceu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista.
A legislação trouxe avanços importantes, como a matrícula obrigatória de estudantes com autismo em escolas comuns e o estímulo à pesquisas e à formação de professores. Dessa forma, a inclusão passou a estar no centro das discussões, evidenciando a necessidade de se produzir conhecimento qualificado para guiar políticas públicas, orientar a formação de professores e auxiliar familiares.
Foi nesse contexto que surgiu a necessidade de atualizar e ampliar Autismo e Educação, como destacam Bosa e Schmidt no prefácio do livro. “Em 2002, defendemos a articulação entre psicologia e educação para atuação e produção de conhecimento sobre TEA. Nesta nova edição, mantivemos esse compromisso e, aos moldes da anterior, convidamos especialistas em suas respectivas áreas para discorrerem sobre os avanços em seus campos de atuação”, explicam os organizadores
Escrito por profissionais com profundo conhecimento do assunto e sensíveis à realidade brasileira, Autismo e Educação — Da Educação Infantil ao Ensino Superior propõe estratégias práticas para quem busca promover a participação plena e significativa dos estudantes com TEA. Os artigos trazem o ponto de vista de psicólogos, neuropsicólogos, pedagogos, fonoaudiólogos, assistentes sociais e intérpretes de sinais, e, juntos, ajudam a definir uma abordagem multidisciplinar e mais ampla sobre o tema.
“Ainda que a ênfase esteja na educação de alunos com TEA e nos processos de inclusão, buscamos compreender essas práticas a partir do conhecimento produzido pela psicologia. Com isso, procuramos contribuir para a elucidação dos processos psicológicos que impactam na aprendizagem, explicam os organizadores.
Para contemplar toda a formação escolar, a obra conta com dez capítulos. Eles são divididos em três partes:
Um dos organizadores do livro, Carlo Schmidt é especialista em Autismo pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), na qual exerce a função de professor associado do Departamento de Educação Especial. Além disso, é mestre e doutor em Psicologia do Desenvolvimento pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e tem pós-doutorado na Purdue University, Estados Unidos.
Em entrevista ao portal Desafios da Educação, o psicólogo fala sobre os avanços no tratamento do TEA nos últimos anos, além das barreiras que ainda persistem — como a formação de professores e a dificuldade de levar descobertas científicas para o dia a dia das salas de aula.
Muita coisa. O próprio diagnóstico, antes pouco claro, agora está muito mais refinado e preciso, contando com instrumentos de rastreio mais sensíveis. Essa é uma das causas do aumento do número de diagnósticos, e, com isso, o maior número de crianças com laudo, ingressando nas escolas.
Esse fato chama a atenção dos pais, professores e demais profissionais para as demandas do autismo. O entendimento de que se trata de um espectro de manifestações amplia a forma de entender essa condição, que antes era representada por crianças com uma grave condição, com estereotipias, se balançando e isoladas. Sabemos que as questões da comunicação são centrais, mas podem se manifestar de inúmeras maneiras, incluindo o autismo em mulheres e adultos.
Acredito que hoje se entende o autismo como uma maneira diferente de se constituir no mundo, com suas singularidades e especificidades. O conceito de neurodivergente mostra isso: uma maneira diferente, e não necessariamente prejudicada ou deficitária.
O avanço das leis, entre elas a Berenice Piana, ajuda muito a impulsionar as políticas públicas. O direito a um acompanhante educacional (profissional de apoio), a impossibilidade de as escolas negarem matrícula de autistas e a estimulação da pesquisa foram resultados importantes dessa lei.
Uma delas é o entendimento de que a criança com TEA muitas vezes fica isolada na escola não porque não gosta de fazer amizades, mas porque tem dificuldade de entender todas as pistas sociais que as outras pessoas usam para se comunicar. Com isso, nos colocamos em uma posição mais ativa de desenvolver recursos e práticas que auxiliem essas crianças a compreenderem o cotidiano escolar e suas relações, para então se engajarem nas tarefas e atividades sociais.
Outro entendimento importante veio com o DSM-5 (2013), quando foram incluídas como critério diagnóstico as alterações sensoriais. Embora isso seja relatado há bastante tempo por pessoas com autismo, como a norte-americana Temple Grandin (uma das maiores referências mundiais da área), ao entrar no manual como critério fornece um outro entendimento sobre as dificuldades sociais dessas pessoas, que muitas vezes não nascem das próprias relações sociais, mas aparecem nelas devido ao excesso de estímulos que utilizamos para nos comunicar. Adaptações e a criação de ambientes mais agradáveis ao perfil das pessoas com TEA têm permitido maior inserção social, reduzindo o estresse derivado dos estímulos excessivos.
Acredito que seja a formação de professores. O desafio é conseguir traduzir as descobertas científicas mais recentes e resultados de estudos para uma linguagem que o professor compreenda e possa utilizar com sucesso em sala de aula.
Embora ainda distante do que seria o ideal, hoje temos um número interessante de estudos nacionais mostrando formas de aprimorar as práticas pedagógicas e torná-las mais inclusivas. É preciso que as formações do corpo docente das escolas disseminem essas práticas, juntamente com a compreensão sobre a possibilidade concreta de aprendizagem desses alunos.
Estamos em um momento em que a produção acadêmica sobre autismo está em franco crescimento. É preciso que esse conhecimento seja levado às escolas. Isso ajudaria sobremaneira não somente no ingresso dos alunos com autismo nas escolas, mas na permanência também.
Sim. A inclusão é possível em todos os contextos que quisermos, basta reconhecermos as barreiras à participação e aprendizagem e mitigá-las ou removê-las. Até pouco tempo atrás, se entendia o autismo como uma condição da infância. Hoje estamos enfatizando a adultez, as atividades laborais e o envelhecimento das pessoas com autismo.
Esse reconhecimento ainda é bastante recente, por isso as práticas e ações de apoio aos estudantes com TEA no ensino superior ainda são incipientes. Uma das grandes contribuições do livro é dedicar três capítulos a este tema, lançando luz para que as universidades, através de seus núcleos de acessibilidade, promovam a inclusão também nesta etapa da educação.
Livro: Autismo e Educação – Da Educação Infantil ao Ensino Superior, 2ª edição
Organização: Cleonice Alves Bosa e Carlo Schmidt
Editora: Penso
Páginas: 180
Previsão de lançamento: final de agosto de 2025
Por Redação
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