Em um vídeo de 90 segundos publicado no Instagram, ao som de “Time” do Pink Floyd, um educador explica conceitos da Língua Portuguesa, como ambiguidade e polissemia. Esse é apenas um entre os mais de 1.600 conteúdos que o professor Noslen compartilha com sua comunidade de mais de 1 milhão de seguidores.
Noslen Borges leciona há 19 anos. Já viu de tudo um pouco quando se trata das dinâmicas de ensino e aprendizagem. Mas, por volta de 2015, um fenômeno chamado “smartphones” ganhou espaço entre os seus estudantes.
“Eu atuava em sete instituições de ensino na época e nenhuma estava preparada para essa realidade. Muitas, inclusive, pediam para que tirássemos da sala de aula alunos que ficassem mexendo no celular”, relembra o professor.
Nesses casos, lutar contra a correnteza não é algo que Noslen acredite ser sábio. Para ele, surfar na onda das tendências é mais vantajoso para todos os envolvidos. E foi exatamente o que ele fez ao conectar as mídias sociais com a educação.
Se não pode vencê-la, junte-se a ela
Um estudo da empresa Yonder Consulting – realizado entre 2021 e 2022, por encomenda do Ofcom, órgão regulador de mídia do Reino Unido – revela que 77% das crianças e adolescentes britânicos entre 8 e 17 anos possuem um perfil em alguma rede social e que um terço deles utiliza uma idade falsa.
O Ofcom ressalta que a população dessa faixa etária está em constante risco de entrar em contato com conteúdos nocivos para sua idade. “Quando um usuário chega aos 16 ou 18 anos, algumas redes introduzem certos recursos e funcionalidades não disponíveis para pessoas mais jovens – como mensagens diretas e a capacidade de ver assuntos de cunho adulto”, explica a entidade.
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A TIC Kids Online Brasil fez um levantamento parecido por aqui, com dados do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). O trabalho mostra que 69% das crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos que têm acesso à internet a utilizam mais de uma vez por dia para diversos fins.
Usando como argumento os potenciais riscos das redes sociais, existem iniciativas que buscam proibir o uso das mídias digitais por crianças. Um exemplo é o PL 2.628/2022 que visa estabelecer regras para que menores de 12 anos não tenham acesso às redes sociais. Contudo, segundo Noslen, medidas como essa não terão efeito nos jovens nascidos nativos digitais.
“Se você proíbe qualquer coisa para um pré-adolescente, ele vai achar aquilo mais interessante. Portanto, o processo adequado é educar as crianças a utilizarem a rede social da maneira correta. Inclusive, utilizá-las dentro da escola para mostrar que tem um caminho saudável na internet, ele só precisa ser peneirado”, orienta.
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É possível educar por meio de redes sociais
Ao perceber essa conexão dos alunos com os celulares e as mídias digitais, Noslen entendeu que aquilo não era uma “moda passageira”, mas que o uso da internet só iria crescer. A partir daí, ele viu um novo caminho de atuação. Com isso, deu o pontapé inicial em seu canal no YouTube.
“A rede social, basicamente, é entretenimento.Há canais com qualidade e os desprovidos dela. Equilibrar esse aspecto com conteúdos educativos e de valor foi o que procurei fazer. Costumo dizer que o que faço se chama ‘educatenimento’”, explica Noslen.
Encontrar uma metodologia própria foi o que funcionou para o educador. Porém, existem metodologias de ensino que se adaptam ao formato das redes sociais. Um exemplo é o Video Based Learning (VBL).
O VBL é compatível com as funcionalidades do TikTok e do Instagram – ambos estão entre os aplicativos mais baixados no mundo e trabalham com ferramentas de vídeo, um meio muito utilizado pelo próprio professor Noslen para transmitir seu conteúdo
O VBL consiste em produzir vídeos didáticos em um formato que estimula a interação por meio de texto, animações com infográficos, cenários e esclarecimentos de conceitos através do storytelling.
Outro recurso que pode ser aproveitado no VBL são os “memes”. Essa expressão se refere a alguma foto ou comentário que, entre outros atributos, contenha uma forma de humor. Noslen, inclusive, usa e abusa de memes, tanto nos conteúdos nas redes sociais, quanto nas suas próprias aulas online.
“Os memes acabam sendo um gênero textual da Língua Portuguesa. Óbvio, ele não está ali para ensinar, mas para brincar com alguma ideia ou conceito. Entretanto, é possível usar para apresentar o conteúdo adequado, como a norma padrão do texto em si”, diz o professor.
Aprender por meio da internet, com vídeos em redes sociais, plataformas de streaming, entre outras, acarretou em uma forma de se fazer educação no mundo atual. Noslen acredita que isso impactará no futuro das crianças.
“Eu espero que os alunos tenham uma habilidade maior de autonomia. Há quem diga que a internet deixa as pessoas preguiçosas, mas depende. Quando o estudante busca conhecimento sozinho, tem que ser mais autônomo para poder entender aquela informação. Para mim, esse é o maior benefício dessa prática de ensino”, defende.
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