Educar para um planeta vivo: o pacto que o ensino superior não pode mais adiar

Thuinie Daros • 4 de novembro de 2025

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    O mundo está em combustão e ainda há quem queira ajustar o ar-condicionado!


    Vivemos em tempo de urgência. Não de moderação. A cada minuto, 11 hectares de floresta desaparecem do planeta. A cada segundo, mais de mil toneladas de lixo são despejadas nos oceanos. E a cada geração que passa, a escola e a universidade seguem ensinando como se nada estivesse acontecendo.


    O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) já não deixa dúvidas: a temperatura média global aumentou 1,3 ºC e cada décimo a mais empurra ecossistemas inteiros para o colapso.


    A ONU projeta que, até 2050, 1,2 bilhão de pessoas serão deslocadas  por catástrofes ambientais. E no Brasil, 80% dos jovens relatam ecoansiedade e desesperança em relação ao futuro (MindMiners, 2024).


    A pergunta que ecoa é inevitável: o ensino superior brasileiro vai continuar assistindo ou vai agir?


    As universidades não são espectadoras da crise. São peças estratégicas no tabuleiro do futuro. Elas formam quem decide, quem cria, quem governa, quem inova. Ou seja: se a universidade falha, o mundo desaba com ela.


    Do discurso à centralidade institucional


    Sustentabilidade não é um selo verde na fachada da reitoria, nem um PDF institucional repleto de boas intenções. Defendo que deve ser o eixo vertebral da educação superior, a estrutura invisível que sustenta o propósito, orienta decisões e define o legado de um instituição.


    As universidades, mais do que qualquer outro espaço social, são laboratórios do futuro. Não há neutralidade possível nesse lugar de poder simbólico e formativo.


    Se quisermos profissionais capazes de agir sobre as grandes crises, sejam elas climáticas, sociais, éticas, tecnológicas ou democráticas, nossas instituições precisam reconfigurar-se por dentro: da governança às finanças, da arquitetura física à cultura simbólica, do discurso institucional à prática cotidiana.


    Criar departamentos de "inovação sustentável", comissões de ESG ou relatórios de impacto que servem mais à reputação do que à regeneração, não são suficientes. A coerência precisa se tornar metodologia.


    Cada plano de curso, cada parceria, cada contrato, cada decisão orçamentária deve responder a uma pergunta inadiável: esta escolha contribui para a regeneração da vida ou para sua deterioração?


    Sustentabilidade, nesse sentido, não é uma agenda ambiental, é uma agenda de sobrevivência institucional e moral. A universidade que ignora o colapso climático perde sua relevância social, seu prestígio científico e, em breve, sua sustentabilidade financeira.


    Os relatórios da Times Higher Education Impact Rankings (2024) e da QS Sustainability Rankings mostram que as instituições mais engajadas nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) têm crescido acima da média em reputação global, empregabilidade dos egressos e captação de investimentos.


    Isso não é coincidência: é a confirmação empírica de que propósito também é estratégia. As IES do nosso tempo não podem ser neutras, afinal, a neutralidade é o disfarce elegante da omissão. É omissão, neste século, é cumplicidade com o colapso.


    Não acredito em caminho alternativo, ou a educação superior se torna parte ativa da regeneração do planeta, ou será lembrada como a instituição que, diante da emergência civilizatória, escolheu permanecer confortável em seus próprios relatórios.

    A metamorfose curricular — da extensão ao núcleo


    Tenho visto algumas instituições de ensino superior comemorarem o avanço de incluir a palavra sustentabilidade em suas ementas, quase sempre como disciplina optativa, periférica, protocolar. Mas sejamos francos: isso é como oferecer um copo d’água em meio a um incêndio. Não se combate colapso planetário com tópicos complementares. O futuro exige currículos vivos, não cartilhas engessadas. Currículos que atravessem fronteiras disciplinares, que unam ciências, artes e tecnologias em torno de propósitos reais. Que não se percam em metodologias de moda, mas se comprometam com a pergunta essencial: o que este conhecimento faz pelo mundo?


    A curricularização da extensão, por exemplo, aponta exatamente nessa direção, e não se trata de cumprir uma exigência burocrática, mas de refundar a lógica epistemológica da educação superior brasileira. A extensão, neste sentido, é o coração pulsante dessa metamorfose por romper com o isolamento acadêmico, devolver o conhecimento ao território e transformar o aprendizado em ação viva e coletiva.


    A universidade precisa se mover, sair das quatro paredes, atravessar o portão, pisar o chão onde as questões reais acontecem. As grandes respostas não estão todas nas bibliotecas; estão também nas periferias urbanas, nos quilombos, nas aldeias, nos laboratórios de inovação social, nas startups de impacto, nos movimentos comunitários.


    Quando o campus pulsa junto com a cidade, com as florestas, com as dores e esperanças da comunidade que o cerca, o saber volta a ter sentido. O estudante entende que teoria e prática não são opostas, mas partes do mesmo ciclo vital do conhecimento.

    Metodologias com propósito planetário


    Vivemos uma era de paradoxos: nunca tivemos tanto acesso à informação e, ainda assim, a ignorância climática prospera. Temos dados em excesso, mas consciência em falta.


    Por isso, o ensino superior precisa reinventar suas metodologias, não para seguir tendências pedagógicas, mas para reaprender a pensar o mundo de modo complexo e integrado. A lógica linear e fragmentada, que separa o humano da natureza e o saber da vida, já não dá conta da realidade.


    É preciso ensinar com o mundo, e não apenas sobre o mundo. Projetos interdisciplinares, intercâmbios virtuais e on-line, laboratórios vivos, simulações sistêmicas, comunidades de prática, missões de impacto real são esses os alicerces da aprendizagem que transforma.


    Educar para um planeta vivo é formar mentes ecológicas, capazes de pensar em rede, cooperar, sentir e agir. Como afirma Edgar Morin, precisamos ensinar “a condição humana em sua totalidade planetária”. Isso não é luxo teórico: é urgência civilizatória!


    O Fórum Econômico Mundial (2024) estimou que 85% das profissões que existirão em 2030 ainda não foram criadas, mas todas exigirão competências éticas, ambientais e digitais integradas. Formar para o futuro, portanto, é formar para a sobrevivência da espécie.

    Inovação sustentável como viabilidade institucional


    As Instituições de Ensino Superior precisam compreender que sustentabilidade não é custo, fardo ou tema bonitinho de marketing institucional. Não é pauta politicamente correta é estratégia de permanência. Em um mundo onde o colapso ambiental já atravessa as fronteiras da economia, da saúde e da própria democracia, a sustentabilidade deixou de ser retórica verde para se tornar critério de sobrevivência institucional, social e moral.


    Universidades que reduzem consumo energético, investem em economia circular, preservam recursos hídricos e implantam práticas ESG genuínas não apenas protegem o planeta elas asseguram a própria continuidade e reputação. O relatório The Green Campus Index (2024) mostrou que instituições com metas de carbono neutro atraem 35% mais alunos internacionais e 30% mais investimentos privados.

    Inovar de forma sustentável, portanto, é inovar de forma competitiva, inteligente e coerente.


    O campus do futuro não é apenas lugar de aulas, mas um ecossistema vivo: painéis de carregamento solar, biodiversidade nos pátios, mobilidade verde, inteligência artificial a serviço da eficiência e da ética, empatia como infraestrutura curricular. Um espaço que ensina pelo exemplo e não apenas pelo discurso.

    Um pacto de responsabilidade histórica


    A cada turma formada, a cada pesquisador orientado, a cada startup incubada, a universidade se inscreve na história. E a pergunta que paira é brutal: qual é a marca que queremos deixar?


    Se continuarmos formando mentes indiferentes à crise planetária, educaremos a extinção. Mas, se tivermos coragem de transformar a educação em ferramenta de regeneração, podemos reescrever o destino humano.


    É triste, quase doloroso, perceber que ainda há quem trate temas como sustentabilidade, ética climática e consciência ambiental como se fossem menores, periféricos, quando, na verdade, são as novas fundações do conhecimento e da própria vida.


    Enquanto isso, a Inteligência Artificial consome volumes massivos de energia e água em centros de dados ao redor do mundo, ironicamente, tecnologia e natureza competindo por sobrevivência.


    E quem está formando as mentes que decidirão esse equilíbrio? A universidade.

    Educar para um planeta vivo é recolocar a vida no centro do projeto educacional.

    A sustentabilidade precisa deixar de ser pauta de congresso e tornar-se razão de existência institucional. Porque as IES são uma força viva que pulsa junto com o planeta. O futuro não pede licença! A Terra está falando.

    

    A educação superior é o espaço mais poderoso de transformação da espécie, se ela se mover. E o tempo para mover-se é agora!

    Por Thuinie Daros

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