A transmissão de conhecimento de forma expositiva se consolidou como prática pedagógica após a primeira Revolução Industrial (1760 a 1860). De lá para cá, muita coisa mudou no mundo. Houve avanços significativos na indústria, na saúde, na tecnologia. Na educação, contudo, certas mudanças ainda encontram resistências. É o que acontece no ensino expositivo: embora importante, é ultrapassado quando usado de maneira isolada.
Eis então que entram em cena as metodologias ativas. Nelas, o principal objetivo é fazer do aluno o protagonista da própria aprendizagem. A ideia é estimular uma maior responsabilidade do estudante pela construção do próprio saber, superando a prática de aulas expositivas e com pouca interação.
Vidal Martins, vice-reitor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), aposta tanto nessa perspectiva que sugere, inclusive, mudar a tradicional nomenclatura Instituição de Ensino Superior (IES) para Instituição de Aprendizagem Superior (IAS).
“É uma proposta que coloca o estudante no centro do processo de aprendizagem”, diz o docente, embora se refira à mudança no termo mais como uma forma de chamar atenção para o tema.
Mudanças necessárias
Quando se fala em ensino, o foco do processo é o professor, pois ensinar é um trabalho do docente. “Se eu digo que somos uma instituição de ensino superior, o peso está na transmissão do conhecimento. Quando se fala em aprendizagem, a gente inverte a perspectiva: quem aprende é o estudante. Se eu digo que quero ser uma instituição de aprendizagem superior. Eu estou falando de um compromisso muito grande com o resultado para o aluno”, explica Martins.
Nessa perspectiva, a alteração vai do modo de preparar aulas à organização dos cursos. Geralmente, os docentes partem do conteúdo, usando referências consolidadas para então pensar suas atividades. Já quando se fala em aprendizagem, o ponto de partida muda e passa a ser a competência que o estudante deve ter ao final da disciplina. Tendo, é claro, uma base teórica bem formada. Trata-se de um saber-agir.
“A diferença é grande porque na primeira abordagem o estudante recebe muito conteúdo, mas não necessariamente tem estímulos para mobilizar esses saberes de forma prática. Já na segunda proposta você pode dar um pouco menos de conteúdo – o que não é ‘enfraquecer’ a aula, ou torná-la mais fácil – e muito mais aplicação desse conteúdo, percepção da utilidade disso na prática”, aponta o vice-reitor da PUCPR.
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Na prática
No modelo tradicional o professor identifica quais são os conteúdos para sua disciplina, filtra esses materiais, os expõe em sala de aula e depois tenta fazer com que o estudante mostre o que aprendeu por meio de avaliações que geralmente envolvem memorização, talvez compreensão e no máximo aplicação em situações conhecidas.
No outro caminho, o primeiro passo é definir quais as competências que se espera que os alunos tenham. Depois, o docente define quais os resultados de aprendizagem ele precisa observar. Em seguida é preciso pensar em quais experiências ele vai oferecer aos alunos para que eles possam demonstrar esses resultados. Nesse sentido, o plano de ensino vira um conjunto de experiências com foco no resultado que se quer obter, tendo como base conteúdos bem referenciados.
Essa proposta muda o projeto pedagógico do curso. Outro aspecto que se transforma é o método de avaliação. Quando se foca em experiência, é preciso passar mais tempo fazendo atividades práticas. Assim, a avaliação tem duas dimensões: uma mais processual, que serve para dar retorno para os alunos, para propor novos caminhos e também reforçar os pontos positivos das experiências. Essa avaliação não necessariamente tem nota, mas serve para acompanhar o aprendizado.
“Esse acompanhamento ao longo do tempo é fundamental para o processo de aprendizagem. Em algum momento se faz a outra avaliação, mais clássica”, nota Martins.
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Superando barreiras
Escolher esse caminho é muito mais complexo do que fazer uma prova objetiva, por exemplo. Isso pode até trazer insegurança para o professor, porque no processo tradicional ele tem controle de tudo. Já em um formato mais aberto, ele pode ser mais questionado e também precisa se adaptar a isso, o que nem sempre é fácil.
Mas o que o professor precisa fazer? Muita formação sobre metodologias para aprendizagem ativa. E mais do que isso: precisa acreditar na ideia. Existem muitas metodologias e cada uma se aplica para uma finalidade diferente.
Também é preciso que os estudantes se adaptem. “É muito mais fácil ser passivo. Muitos não gostam desse modelo no início, mas depois que as coisas vão acontecendo, os alunos percebem a riqueza dessa proposta. E veem o quanto aprendem mais, o quanto interagem mais e isso também gera um senso de pertença maior”, finaliza Martins.
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