Saber lidar com as emoções é um desafio em qualquer fase da vida. A diferença é que na infância tudo toma uma dimensão maior, além de termos menos recursos para identificar o que sentimos e expressar o que nos aflige.
Por isso, nem sempre o “está tudo bem” ou o “não chore por isso” são abordagens assertivas. Ao invés de tentar entender a criança e ajudá-la a enfrentar suas dificuldades, frases como essas invalidam os sentimentos dos pequenos.
Mas, afinal, como preparar os alunos para lidar com emoções complexas? Com as habilidades socioemocionais e a saúde mental, cada vez mais, valorizadas, é fundamental dar atenção ao acolhimento emocional na escola – em todos os sentidos, desde a primeira infância.
Reconhecer os sentimentos faz a diferença
Uma pesquisa publicada no periódico American Journal of Public Health mostrou conexões entre o desenvolvimento de habilidades socioemocionais durante a infância e o sucesso na vida adulta. Os pesquisadores acompanharam um grupo de indivíduos em dois momentos: quando estavam na educação infantil e, depois, ao completarem 25 anos.
O estudo encontrou associações estatisticamente significativas entre as habilidades socioemocionais medidas no jardim de infância e a situação dos jovens adultos em quesitos como educação, emprego e saúde mental. Segundo a avaliação, aqueles que, quando crianças, já demonstravam mais disposição para ajudar e compartilhar, por exemplo, tinham mais chances de se formar e conquistar um emprego em período integral.
Nesse sentido, o ambiente escolar pode fazer toda a diferença na vida das crianças, oferecendo a oportunidade de observar e incentivar as habilidades interpessoais em formação. Além disso, educar as emoções no ambiente escolar é uma das competências e habilidades propostas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
De acordo com a BNCC, os eixos estruturantes das práticas pedagógicas da Educação Infantil são as interações e a brincadeira.
A interação durante o brincar caracteriza o cotidiano da infância, gerando aprendizagens e potencializando o desenvolvimento integral. Ao observar as interações e as brincadeiras entre crianças e adultos, é possível identificar a expressão dos afetos, a mediação das frustrações, a resolução de conflitos e a regulação das emoções.
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“Emocionômetro”
No Colégio Franciscano Pio XII, localizado no bairro do Morumbi, em São Paulo, as crianças são estimuladas desde cedo a reconhecer e a lidar com o que sentem. O projeto chamado “emocionômetro” existe há mais de oito anos. Atualmente, participam crianças a partir dos três anos.
A iniciativa é composta por diversas atividades, como o levantamento prévio do que são os sentimentos e a apresentação do livro “O Monstro das Cores”, de Anna Llenas, exibição de vídeos, filmes, trabalhos com músicas, confecção de monstrinhos, contação de histórias e atividades envolvendo o reconhecimento das emoções por meio das expressões faciais, jogos e muita conversa em grupo.
“Na roda de conversa com a professora e os colegas, eles falam sobre as emoções, e, com isso, começam a entender o que estão sentindo”, explica Paula Neves Fava Bon, orientadora educacional da Educação Infantil e do 1º ano do Ensino Fundamental do Colégio Franciscano Pio XII. “Dessa maneira, aprendem a nomear o sentimento, como lidar com ele e até a sair de um estado de tristeza”, conta Bon.
Como parte das atividades, as crianças confeccionam o “emocionômetro”, um recurso lúdico que auxilia a identificar as emoções. Nele, escolhem o monstro que representa o que estão sentindo naquele momento.
“No início, tudo é muito visual. Depois, começa a atividade com o ‘emocionômetro’, para definir no desenho como eles se sentem. A criança pode chegar triste e depois se envolver em atividades durante o dia, ter transitado por vários sentimentos e ficar feliz”, explica a educadora.
Em 2021, durante a volta às aulas presenciais, os estudantes do 1º ano do Ensino Fundamental I participaram da iniciativa. “No começo, as crianças demoraram um tempo para se readaptarem. Elas voltaram diferentes e precisaram reaprender a se relacionar. Em muitos momentos, o ‘monstrinho confuso’ era o que mais aparecia entre os sentimentos”, lembra a profissional.
Para ela, o mais importante é oferecer um momento de escuta para as crianças. “Queremos mostrar que tudo bem ter sentimento. Como a criança vai lidar com isso é o que o projeto nos traz. E eles respondem muito bem”, enfatiza a orientadora.
“Desenvolver a inteligência emocional desde pequeno pode formar adultos mais autoconfiantes, persistentes, motivados e capazes de controlar as próprias emoções”, afirma Bon, projetando a continuidade e a ampliação do projeto para 2022.
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