O governo federal lançou, na semana passada, a nova Política Nacional de Educação Especial (PNEE). O decreto permite que mais de 1,3 milhão de estudantes com deficiência, transtornos do desenvolvimento, como autismo, e altas habilidades frequentem salas e escolas especiais – sob argumento de que, nesses contextos, eles terão atendimento especializado, conforme suas necessidades.
Para o governo, a nova política é um avanço.
“Equitativa e inclusiva ao longo da vida, a PNEE representa um passo significativo desse governo rumo a um país mais justo e com igualdade de oportunidades”, disse a primeira-dama Michelle Bolsonaro, que ocupa a posição de presidente do Conselho do Programa Pátria Voluntária.
Para parte dos educadores, a medida é um retrocesso.
“Em uma sociedade moderna, isso é inconcebível, é querer separar pessoas em caixinhas. Temos que trabalhar nas barreiras que impedem essa pessoa de ter acesso e participação no mundo e não em acentuar suas diferenças”, disse a coordenadora do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diferença (Leped) da Unicamp, Maria Teresa Mantoan, segundo o jornal O Estado de S. Paulo.
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A nova PNEE substitui a Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva de 2008. Esta, que coloca a escola comum no centro do processo de inclusão, foi a ação responsável pelo aumento das matrículas dos estudantes especiais – chegando a 1,3 milhão na educação básica.
Embora alinhada com as convenções nacionais e internacionais de inclusão, a política de 2008 entrou em revisão ainda em 2017, no governo Michel Temer. Bolsonaro continuou o processo, alegando necessidade de atualizar a política de educação especial em relação à legislação em vigor.
“Um dos princípios norteadores desta política nacional é a valorização das singularidades e do direito do estudante e das famílias no processo de decisão sobre a alternativa mais adequada para o atendimento educacional especializado”, afirmou o ministro da Educação, Milton Ribeiro.
De acordo com o texto, a adesão por estados e municípios à PNEE será voluntária.
Decreto da PNEE pode ser derrubado
Para Régis Henrique dos Reis Silva, que é professor da Unicamp e doutor em filosofia e história da educação, a PNEE retoma práticas implementadas no Brasil nos anos 1970 e 1980 – e que foram abolidas para dar espaço à inclusão de todos os alunos.
“Não é uma ruptura, mas a diferença é o modo como isso vai ser organizado e estruturado. Além disso, chama atenção a responsabilidade que o documento dá para a decisão das famílias, delega a escolha para elas”, analisou ele, segundo o portal G1.
A Rede Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Rede-In), composta por 20 entidades da sociedade civil, manifestou “intenso repúdio” ao Decreto n° 10.502/2020.
“É inaceitável que, por meio de Decreto Presidencial, sem qualquer legitimidade democrática, se dê um retrocesso de mais de 30 anos de luta pela inclusão e diversidade” diz a nota da Rede-In, publicada no site do Instituto Rodrigo Mendes.
Segundo o Estadão, diversas entidades da sociedade civil estão se organizando para entrar na Justiça contra a nova Política Nacional de Educação Especial. A deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) também informou, via Twitter, que ingressou com um projeto para tentar barrar o decreto do Executivo.
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