Em janeiro passado, a convite do portal Desafios da Educação, a educadora Thuinie Daros* elencou cinco tendências pedagógicas para acompanhar em 2023. O objetivo do artigo era falar do impacto das transformações digitais e propor uma reflexão sobre o papel das práticas aplicadas até o momento para os alunos. Seriam elas relevantes? Ou já estariam em desuso?
No texto, Daros levou em consideração que uma abordagem unidirecional de ensino não faz mais sentido nos dias de hoje e defendeu que as instituições precisam acompanhar as principais tendências e abordagens educacionais. “Não como um mero modismo metodológico, mas com o objetivo de tornar o processo de aprendizado mais flexível, acessível, interativo e, sobretudo, convergente com as necessidades formativas dos estudantes da contemporaneidade”, escreveu.
Quase um ano depois, perguntamos à educadora se as cinco tendências que nos indicou para acompanhar em 2023 se confirmaram – e, em caso negativo, o que falta para isso acontecer.
Aprendizagem ubíqua
Também conhecida como U-learning, a aprendizagem ubíqua é resultado do acesso ao conhecimento por meio de dispositivos móveis, não dependendo necessariamente de um profissional na mediação. O objetivo é promover o desenvolvimento pessoal e profissional por meio da autoaprendizagem.
Para Thunie Daros, essa tendência se concretizou, mesmo que de forma parcial. “As tecnologias digitais, ainda que não totalmente integradas aos currículos escolares, têm revolucionado a educação. Esse fenômeno está crescendo exponencialmente no Brasil, tanto em escolas quanto em instituições de ensino superior (IES). Além disso, a expansão das edtechs tem permitido que o aprendizado se estenda para além das salas de aula tradicionais”, afirma.
Segundo a educadora, o movimento é impulsionado principalmente pela geração que cresceu cercada por tecnologia, com dispositivos inicialmente voltados para entretenimento, como videogames e smartphones, que agora se integram ao contexto educacional. “Para ilustrar a comprovação desta tendência, um relatório da Grand View Research mostra que o mercado global de tecnologia educacional, avaliado em US$ 123,4 bilhões em 2022, está crescendo a uma taxa anual composta de 13,6% agora em 2023”, destaca ela.
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Objetos e recursos de aprendizagem com base na economia da atenção
A economia da atenção é uma abordagem que trata da necessidade de gerenciar a quantidade de informações por considerar a atenção humana um elemento escasso. Daros observa que o uso de objetos e recursos de aprendizagem com base nesse método não só se materializou em 2023 como ainda será um tema amplamente explorado nos próximos anos.
“Um exemplo claro disso é a ‘facebookização’ dos materiais educacionais. As plataformas de aprendizado estão incorporando elementos das redes sociais, como feeds personalizados, para fornecer conteúdo relevante e estimulante. Isso não só atrai a atenção dos alunos, mas também promove a interação e o envolvimento com o conteúdo”, aponta.
Outro exemplo é o chamado “efeito montanha-russa” no design de cursos. O método alterna entre momentos intensos de aprendizado e atividades mais leves, mantendo os alunos engajados e evitando a monotonia. “Um módulo pode começar com um vídeo interativo, seguido de um exercício prático desafiador e depois uma atividade mais relaxante, como uma leitura reflexiva”, afirma a especialista.
“Além disso, estamos vendo o uso de ‘input’ e ‘output’ para capturar e manter a atenção dos estudantes. Isso envolve não apenas fornecer informações (input), mas também engajar os alunos em atividades que permitam que eles apliquem e demonstrem o que aprenderam (output)”, complementa Daros. Nesse caso, ela diz que, após assistir a um vídeo educativo, os estudantes podem ser encorajados a participar de um quiz online ou um projeto de grupo, o que ajuda na apropriação do conhecimento e a manter o interesse.
Cursos baseados em coorte
A aprendizagem baseada em coorte é uma abordagem em que um grupo de pessoas faz um curso com interesses e objetivos em comum e, portanto, pode participar de uma comunidade enquanto aprende algo. Nesse caso, Daros é enfática: “O termo não foi usado ou debatido, e não observo sua popularização. No entanto, vale destacar que a metodologia em si, sim”.
Esses cursos, muitas vezes chamados de “nichados”, se mostraram mais atraentes do que os formatos tradicionais apenas com aulas e vídeos gravados, devido à natureza interativa e personalizada. “O aumento no interesse por cursos telepresenciais ativos reflete uma mudança significativa na preferência dos estudantes e na abordagem pedagógica. Um exemplo é o aumento de bootcamps de programação, nos quais os alunos trabalham juntos em projetos, promovendo um ambiente de aprendizado colaborativo e focado”, explica.
Novas arquiteturas pedagógicas
A arquitetura pedagógica é um conjunto de premissas que representa e orienta a forma como se organiza o currículo, criando interações entre professores, estudantes, conhecimento e objetos de aprendizagem. “Em 2023, além da evolução rumo a novas arquiteturas, também observamos a aceitação crescente do termo ‘modelagens’ no contexto educacional. Esta abordagem representa uma síntese de diferentes metodologias, recursos e estratégias, marcando uma transição para uma educação mais integrada e sustentável”, argumenta Daros.
Segundo ela, a essência de “modelagens” reside na capacidade de combinar variadas técnicas e ferramentas para atender às necessidades dos estudantes. “A junção da aprendizagem baseada em projetos com a tecnologia digital transforma o processo educacional, tornando-o mais envolvente e eficaz. Outro exemplo são os modelos híbridos, cuja integração de atividades presenciais com tecnologias digitais avançadas cria uma experiência de aprendizado mais rica e envolvente.”
Novos modelos de certificação
Se a microcertificação por competências já era uma tendência no Brasil devido à necessidade de melhorar e acelerar o processo de desenvolvimento de carreira, em 2023, conforme Daros, foi observada a emergência de novos modelos de certificação na educação.
“Eles representam uma evolução significativa nos critérios de avaliação, expandindo o foco para além das competências acadêmicas tradicionais. Embora ainda estejam em fase de crescimento e popularização, seu impacto e relevância são inegáveis”, pontua a especialista.
Para compreender essa mudança, ela indica o livro “The Future Internet: How the Metaverse, Web3, and NFTs Will Transform Business & Society (“A Internet do Futuro: Como o Metaverso, a Web3 e os NFTs Transformarão os Negócios e a Sociedade”), de Bernard Marr. “Estrategista digital e futurista renomado, Marr explora como as tecnologias emergentes, como blockchain e realidade aumentada, estão redefinindo vários setores, incluindo a educação”.
A utilização de blockchain na educação, ressalta Daros, também é uma nova forma de validar e compartilhar competências e realizações educacionais. Essa tecnologia permite a emissão de credenciais digitais seguras e verificáveis, facilitando o reconhecimento global de habilidades e conhecimentos adquiridos.
“O uso de blockchain na certificação educacional responde à necessidade de nossos estudantes competirem em um mercado global. Ao fornecer comprovações de competência mais universais e acessíveis, estamos não apenas validando suas habilidades de forma mais ampla, mas também impulsionando a economia global. Este desenvolvimento, ainda em ascensão, promete expandir e transformar ainda mais o setor educacional nos próximos anos”, conclui.
*Thuinie Daros é diretora de Planejamento Acadêmico na Vitru Educação, mantenedora da Uniasselvi e Unicesumar. Também é autora de diversos livros na área de inovação educacional, palestrante e facilitadora de workshops sobre temáticas que capacitam profissionais a aplicar metodologias ativas, promover a criatividade e explorar abordagens híbridas de educação e incorporar a pedagogia de futuros em suas práticas pedagógicas e dentro do contexto empresarial (formação de líderes).
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