A alfabetização é uma das principais etapas da educação, sendo fundamental para promover a capacidade de leitura, compreensão e interpretação de texto. Também é um componente importante para o desenvolvimento de uma nação.
Recentemente, o Brasil recuperou o desempenho de alfabetização que era observado antes da pandemia de Covid-19. Segundo o Ministério da Educação (MEC), 56% dos alunos de escolas públicas do Brasil, aos 7 anos, estavam alfabetizados em 2023.
“Em 2019, o percentual de estudantes alfabetizados na rede pública do país era de 55%, percentual que, com a pandemia, caiu para 36% em 2021”, destacou o ministro Camilo Santana durante a apresentação de resultados do Compromisso Nacional Criança Alfabetizada.
Apesar do avanço, ainda há muito a ser feito para alcançar uma alfabetização universal e de qualidade.
Comparado com o índice de antes da pandemia, o crescimento médio nacional foi de apenas um ponto percentual. E ele foi puxado para baixo por São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais (que estão entre os maiores PIBs do País) e Bahia (o maior PIB da Região Nordeste).
De acordo com especialistas, a combinação de desigualdade, infraestrutura insuficiente, e respostas variadas à pandemia pode ter contribuído para uma recuperação mais lenta no desempenho de alfabetização.
Saiba qual a diferença entre alfabetização e letramento
A distinção entre alfabetização e letramento é essencial para entender o processo educacional. Embora os termos sejam frequentemente usados de forma intercambiável, eles possuem significados distintos e complementares.
Alfabetização refere-se à habilidade básica de ler e escrever. Este processo envolve o aprendizado do alfabeto, a decodificação de palavras e frases, e a compreensão dos sons das letras e sílabas. A alfabetização é o primeiro passo no desenvolvimento da capacidade de comunicação escrita e é fundamental para a educação inicial.
Letramento, por outro lado, vai além da simples capacidade de ler e escrever. Ele se refere ao uso competente e crítico da leitura e escrita em contextos sociais. O letramento envolve a capacidade de interpretar, compreender e produzir textos complexos, além de utilizar essas habilidades em diversas situações cotidianas, como interpretar um manual, escrever um e-mail ou entender uma notícia.
O que significa ser alfabetizado em nosso país?
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) sobre educação de 2023, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que o Brasil ainda tem 9,3 milhões de analfabetos. Desse grupo, 8,3 milhões têm mais de 40 anos.
A alfabetização na idade certa é fundamental para que as crianças consigam seguir sua vida com sucesso. Mas o que exatamente significa ser alfabetizado?
Aprender a reconhecer letras, juntar sílabas e fonetizar não é o mesmo que empregar essas habilidades em propósitos comunicativos.
O levantamento Alfabetiza Brasil, que contou com a participação de 251 professoras de 206 cidades do País, estabeleceu os parâmetros necessários para considerar uma criança como alfabetizada. São eles:
- Capacidade de ler pequenos textos, formados por períodos curtos e localizar informações na superfície textual;
- Conseguir produzir inferências básicas com base na articulação entre texto verbal e não verbal, como em tirinhas e histórias em quadrinhos;
- Escrever textos que circulam na vida cotidiana para fins de comunicação simples, como convites e lembretes, mesmo que com desvios ortográficos.
De acordo com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o foco da ação pedagógica nos dois primeiros anos do Ensino Fundamental deve ser a alfabetização, de maneira que as crianças “se apropriem do sistema de escrita alfabética de modo articulado ao desenvolvimento de outras habilidades de leitura e de escrita e ao seu envolvimento em práticas diversificadas de letramentos”.
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Os prejuízos causados pelo atraso na alfabetização
“Aprender a ler, a escrever, alfabetizar-se é, antes de mais nada, aprender a ler o mundo.”
A famosa frase de Paulo Freire sintetiza a importância da alfabetização na vida de qualquer indivíduo.
Além de ser pilar para todas as disciplinas, a capacidade de ler e escrever de maneira adequada mobiliza diferentes dimensões do sujeito.
O atraso na alfabetização de uma criança resulta em danos socioemocionais, prejuízos na escolaridade como um todo, taxas mais altas de reprovação e uma tendência ao abandono escolar.
Além disso, o comprometimento do aprendizado do alfabeto e de sua utilização como código de comunicação tende a acompanhar o estudante ao longo de sua trajetória escolar, refletindo mais tarde em piores condições de emprego e renda.
Quais são os desafios da alfabetização no Brasil?
A educação no Brasil enfrenta desafios históricos, como falta de professores, material didático desatualizado e má gestão de recursos.
Outro problema é que muitas crianças estão fora da escola. Segundo o Censo Escolar, foram contabilizadas 47,3 milhões de matrículas nas 178,5 mil escolas de educação básica no Brasil no ano passado — cerca de 77 mil a menos, na comparação com 2022.
Além daqueles que sequer são matriculados, também existem os alunos que abandonam as aulas e não concluem o ano letivo. Quase 400 mil crianças e jovens de 6 a 14 anos não estavam frequentando a escola em 2023, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no dia 22 de março de 2024.
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Um problema solúvel
Durante a pandemia, a situação da alfabetização no Brasil piorou com a transposição forçada das atividades escolares para um modelo de ensino remoto emergencial.
Nem todas as escolas tinham estrutura para capacitar profissionais. Enquanto a maior parte das famílias não dispunham de espaço, equipamentos e tempo para acompanhar as crianças que precisavam de suporte.
Em maior ou menor grau, quem tinha acesso à tecnologia conseguiu manter uma rotina escolar. Entretanto, isso, por si só, não garantiu que as crianças aprendessem e se alfabetizassem.
Em 2022, por exemplo, o percentual de crianças privadas do direito à alfabetização dobrou em relação a 2020: passando de 1,9% para 3,8%, segundo pesquisa da Unicef.
Tempo insuficiente dedicado às atividades em sala de aula e a menor escolaridade dos pais são fatores que influenciaram o desempenho escolar.
Assim, para que a alfabetização a distância produza bons resultados, é indispensável que família e escola façam os seus papéis em conjunto.
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Recomendações para avanços na alfabetização
Para superar os desafios mencionados e garantir uma alfabetização eficaz e inclusiva, é crucial adotar um conjunto de estratégias abrangentes que envolvam políticas públicas, investimento em infraestrutura e apoio às famílias. A seguir, apresentamos algumas recomendações específicas:
Formação e valorização de professores
Programas de capacitação devem ser oferecidos regularmente, com foco em metodologias inovadoras e práticas pedagógicas eficazes. Além disso, é essencial melhorar as condições de trabalho e remuneração dos educadores para atrair e reter profissionais qualificados.
Investimento em infraestrutura escolar
É necessário investir na construção e manutenção de instalações escolares, fornecendo salas de aula bem equipadas, bibliotecas atualizadas e acesso a recursos tecnológicos. Esse investimento deve ser prioritário em regiões mais carentes, onde a defasagem é mais acentuada.
Material didático atualizado e de qualidade
Desenvolver e distribuir material didático atualizado e alinhado com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é essencial para apoiar o processo de alfabetização. Esses materiais devem ser diversificados e incluir livros, jogos educativos, softwares e outros recursos que facilitem o aprendizado de forma lúdica e interativa.
Programas de apoio às famílias
O envolvimento familiar é um componente crucial para o sucesso na alfabetização no Brasil. Programas que orientem os pais sobre como apoiar o aprendizado de seus filhos em casa podem fazer uma grande diferença. Isso pode incluir workshops, guias práticos e plataformas online com atividades e recursos educativos.
Monitoramento e avaliação contínua
Implementar sistemas de monitoramento e avaliação contínua do progresso da alfabetização permite identificar áreas de melhoria e ajustar as estratégias conforme necessário. Ferramentas de avaliação diagnóstica podem ajudar a medir o desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita dos alunos, fornecendo dados para intervenções precisas e oportunas.
Parcerias público-privadas
Estabelecer parcerias entre o setor público e o setor privado pode potencializar os recursos disponíveis para a educação. Empresas podem colaborar oferecendo tecnologia, infraestrutura, programas de voluntariado e financiamento para projetos educacionais específicos, contribuindo para a melhoria da alfabetização no Brasil.
Enfoque na equidade educacional
Para reduzir as disparidades regionais e socioeconômicas, é essencial adotar políticas que promovam a equidade educacional. Isso inclui alocação de recursos adicionais para escolas em áreas desfavorecidas, programas de incentivo à permanência escolar e iniciativas que visem a inclusão de grupos historicamente marginalizados.
Inovação no ensino remoto
Diante de crises como a pandemia ou desastres naturais, é importante desenvolver abordagens criativas para o ensino remoto. Investir em plataformas de educação online robustas, capacitar professores para o ensino à distância e garantir que todos os alunos tenham acesso a dispositivos e internet são medidas essenciais para manter a continuidade educacional.
Ao implementar essas recomendações de forma integrada e coordenada, o Brasil pode avançar significativamente na construção de uma sociedade mais alfabetizada, reduzindo as desigualdades e oferecendo a todas as crianças a oportunidade de um futuro melhor.
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Alfabetização e ensino remoto: dicas para ajudar os alunos em situações de emergência
Os eventos extremos que ocorreram na bacia do Guaíba, corpo hídrico localizado no Rio Grande do Sul, impediram quase 400 mil alunos de frequentar a sala de aula em maio de 2024.
À semelhança da pandemia, a tragédia que deixou escolas embaixo d’água ressalta a importância de abordagens criativas e recursos adequados para dar continuidade ao trabalho educativo.
Aqui estão algumas maneiras de tornar a alfabetização remota mais eficaz:
- Plataformas de educação online: utilize aplicativos e plataformas educacionais que ofereçam recursos específicos para a alfabetização, como jogos interativos, atividades de leitura e escrita, e vídeos educativos. Essas ferramentas podem fornecer uma experiência mais envolvente para os alunos.
- Aulas virtuais interativas: permita sempre que os alunos possam participar de atividades de leitura em grupo, discussões sobre histórias e práticas de escrita. O uso de ferramentas de videoconferência pode ajudar a criar um ambiente de aprendizagem colaborativo.
- Recursos adaptativos: adapte o ensino conforme o nível de habilidade de cada aluno. Isso pode incluir programas de aprendizagem personalizados ou atividades diferenciadas que atendam às necessidades individuais de cada criança.
- Suporte familiar: envolver os pais no processo de alfabetização remota é essencial. Fornecer orientações claras sobre como apoiar o aprendizado em casa e disponibilizar materiais educativos para uso familiar pode ajudar a reforçar o aprendizado fora do ambiente escolar.
- Feedback personalizado: converse com os alunos para ajudá-los a identificar áreas de melhoria e reforçar seus pontos fortes. Isso pode ser feito através de avaliações individuais, revisão de trabalhos escritos e interações 1:1 durante as aulas virtuais.
- Flexibilidade e empatia: reconheça que cada aluno pode enfrentar desafios únicos durante o ensino remoto e esteja preparado para oferecer apoio conforme necessário. Praticar a empatia e estar aberto a ajustar as estratégias de ensino pode ajudar a garantir que todos os alunos tenham a oportunidade de ter sucesso na alfabetização.
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