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Competências e personalização dão roupagem disruptiva à Unisinos

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Alunos em campus da Unisinos, em Porto Alegre. Créditos: divulgação/Unisinos/Rodrigo W. Blum.

Em geral, os gestores costumam ter autonomia para planejar a proposta de diferenciação de suas instituições de ensino superior (IES). O problema é que as decisões nem sempre chegam à ponta mais importante do processo: os alunos. “Vejo muitas inovações pontuais, mas nada sistêmico como estamos fazendo”, afirma Gustavo Severo de Borba, diretor da unidade de graduação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos).

Com dois campi no Rio Grande do Sul – a sede, em São Leopoldo, e outro em Porto Alegre –, a Unisinos anunciou em setembro que vai remodelar o currículo de 21 de seus 76 cursos de graduação. Chamada de Graduação Pro, a nova grade passa a valer em 2019 e busca dar mais autonomia aos estudantes.

As novidades contemplam processos como mentoria, mapeamento de competências e personalização da formação. Para isso, a IES criou trilhas estratégicas, capazes de dar uma orientação focada ao aluno na reta final do curso: empreendedorismo, inovação social, internacionalização, mestrado e específica.

Na trilha específica do curso, por exemplo, um graduando em Direito pode participar de atividades preparatórias para concursos públicos, um objetivo cada vez mais presente entre os estudantes. Na trilha de empreendedorismo, no lugar do TCC o aluno desenvolve um plano de negócio, e o projeto poderá ser incubado na própria universidade. Já a de mestrado é voltada a quem pretende seguir a trajetória acadêmica, cursando ainda na graduação disciplinas da pós – e abatendo créditos, inclusive.

Borba (na foto abaixo, durante lançamento do Graduação Pro) afirma que a adoção dessas trilhas é uma iniciativa pioneira no Brasil. Ao disponibilizar cinco caminhos a serem trilhados pelo aluno, a Unisinos transcende um movimento que se tornou comum entre IES nos últimos anos: preparar o estudante para o mercado.

Etapas e competências

A transformação curricular da Unisinos envolve o aluno do início ao fim de sua trajetória acadêmica. As trilhas são reservadas para a etapa final, escolhidas a um ano da formatura. Nos primeiros semestres, a novidade fica por conta de disciplinas comuns entre os cursos. Elas são reaproveitáveis. Se o aluno de Publicidade e Propaganda trocar para Jornalismo, reaproveitará as disciplinas dos dois primeiros semestres. Se trocar para Engenharia Elétrica, preserva os conteúdos do primeiro semestre.

A ideia é que, ao longo da jornada acadêmica, o discente se ambiente e faça uma escolha assertiva para a carreira. “Em 1995 havia três ou quatro engenharias; hoje são 16. Na saúde é a mesma coisa. O jovem não tem muita certeza do que quer”, observa Borba, em entrevista ao Desafios da Educação.

Outra inovação diz respeito à disciplina de mentoria. Por meio de um atendimento individualizado feito no começo da graduação, um professor torna-se mentor de no máximo 24 alunos – até que se formem. Ao longo da graduação, o estudante é submetido a avaliações que podem render a ele três certificações de nível intermediário.

Todas essas iniciativas são sustentadas por uma renovação no modelo de ensino-aprendizagem. Seguindo uma proposta de formação transversal, a Unisinos deixa para trás padrões conservadores e abre espaço ao desenvolvimento de competências.

 Leia mais: Por que se fala tanto em competências para a educação?

Partindo da premissa de que a construção de conhecimento é um processo individual, no fim de 2017 a IES lançou a plataforma Unisinos Lab. A ferramenta congrega atividades complementares e módulos voltados à potencialização do saber – que vão de extensões e iniciação científica a cursos massivos online (MOOCs, na sigla em inglês), vídeos de empreendedorismo e projetos de inovação social.

Dos 21 mil matriculados na universidade, mais de 3 mil já utilizam a plataforma para o aprimoramento de competências. “Com base em muito estudo, vimos que os cursos estavam tão voltados ao mercado que algumas competências ficavam em segundo plano”, explica Borba.

Ele conta que a Unisinos buscou benchmarks de países como Finlândia, Singapura e Canadá para mapear competências e chegar a um conjunto de dez, consideradas essenciais  para o profissional do século 21. Entre elas, responsabilidade socioambiental, comunicação, formação cultural e pensamento computacional.

“O aluno pode estar na faculdade de Direito e querer ampliar uma competência diferente, como atitude empreendedora. Isso entra como atividade complementar e também no portfólio dele”, diz Borba.

Com isso, cada estudante terá um aperfeiçoamento particular. E, ainda que tenha o mesmo diploma do colega, contará com um histórico capaz de diferenciá-lo.

Leia mais: As lições de Portugal, Inglaterra e Finlândia para a educação

Onde tudo começou

A transformação no modelo de ensino empreendida pela Unisinos remonta a 2003. Naquele ano, a universidade lançou uma graduação em Administração de Empresas intitulada Gestão para Inovação e Liderança (GIL). Com 40% a mais de carga horária em relação aos cursos convencionais e turmas de no máximo 25 alunos, a graduação exige dedicação em tempo integral até os últimos semestres, quando se abre a possibilidade de o estudante ir a mercado.

“O curso tinha o pressuposto de acabar com a ideia mais disciplinar, de cadeiras separadas, e partir para trabalhos de resolução de problemas”, rememora Borba. Foi assim que as disciplinas deram lugar a programas de aprendizagem. “No começo, as pessoas não entendiam a proposta muito bem, mas depois a assimilaram.”

No GIL, as aulas são multidisciplinares e ficam a cargo de um professor vinculado a uma das disciplinas do programa. “A atuação desse professor diz respeito à área dele e de dialogar com as demais. Então começamos a pensar diferente em relação à lógica da sala de aula.”

Unisinos, em Porto Alegre

Desde então, a Unisinos tem apostado em inovações constantemente. E, como acontece em todo experimento inovador, às vezes algo não sai conforme o esperado. Exemplo disso foi a graduação de Formação de Escritores, que acabou extinta, e a Faculdade de Rock, que se tornou um tecnólogo em Produção Fonográfica.

Mas a ideia dos programas de aprendizagem, em substituição às disciplinas estanques, foi comprada pela IES. Sobretudo depois de 2008, quando a Escola de Design da universidade firmou parceria com a Escola Politécnica de Design de Milão.

Por si só, o design já pressupõe a ideia de projetação, e na Unisinos o curso tem disciplina de ateliê de projeto que coloca o aluno em contato com clientes. “Isso fortaleceu a visão da universidade de que a lógica de sala de aula precisava ir além da grade de disciplinas específicas”, diz o diretor da unidade de graduação da Unisinos.

A partir de 2012, o Programa de Pós-Graduação em Design passou a debater – através de um núcleo multidisciplinar – a relação professor-aluno, o impacto da tecnologia e tendências internacionais.

Gustavo Borba conta que a IES usou muito do que era produzido pelo grupo de maneira experimental nos cursos, como se fossem laboratórios. “A partir dali, focamos em três coisas: análise de currículos, análise de espaço físico, que culminou com a abertura do campus de Porto Alegre, e engajamento professor-aluno”, relata Borba.

Enquanto prepara a adoção dos novos currículos, que começa no próximo semestre, a Unisinos prepara a opção da migração curricular aos alunos que ingressaram nos últimos anos.

Confira a série Educação e trabalho

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