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A qualidade do ensino superior está em debate e a bola da vez são os cursos a distância. O tema voltou à pauta devido aos resultados do último Censo do Ensino Superior e do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade).

Nos últimos dez anos, o número de graduações a educação a distância (EaD) aumentou 700%, saltando de 1.148, em 2012, para 9.186, no ano passado. Esse fator, associado à queda de matrículas no presencial, fez o Ministério da Educação (MEC) se preocupar com a qualidade da formação profissional no País.

No Dia Nacional da Educação a Distância, o Desafios da Educação levanta o debate sobre o cenário e os rumos da modalidade no Brasil. Confira!

O cenário do EaD

“A educação a distância é um caminho sem volta”, afirma o educador e consultor em gestão educacional Ryon Braga. E ele está certo. Desde o momento que a EaD superou o formato presencial em número de ingressantes, os números não caíram. Pelo contrário: em 2020, primeiro ano da pandemia, os matriculados em um curso a distância no Brasil representavam 53% do total de universitários. Em 2022, esse índice subiu para 65%.

Hoje a modalidade já recebe dois a cada três estudantes que ingressam nas instituições de ensino superior (IES). Isso significa um total de 3,1 milhões de alunos.

O ritmo de criação de novos cursos EaD foi impulsionado, em 2018, pela edição de um decreto do então presidente Michel Temer, que flexibilizou a abertura de polos da modalidade no País. Desde então, houve um crescimento de 189,1% na oferta desse tipo de curso.

De acordo com o Censo do Ensino Superior, a modalidade a distância esteve presente em 3.219 municípios brasileiros em 2022. E, das 22 milhões de vagas oferecidas para o ingresso no ensino superior, 75% são via EaD. Essa prevalência foi notada em licenciaturas e cursos tecnológicos.

Fonte: INEP.

A educação a distância vive um cenário promissor?

Todo esse cenário de crescimento da EaD fez reacender a discussão sobre a qualidade desses cursos. “A qualidade e o monitoramento dos cursos a distância são importantes, assim como são no ensino presencial”, aponta a diretoria da Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED)*.

Ryon Braga concorda. “No Brasil, o formato ainda não alcançou sua maturidade e padece de problemas estruturais importantes”, diz. Para ele, nem as IES acertaram a mão no modelo adequado e nem o MEC conseguiu encontrar um equilíbrio entre o necessário controle de qualidade e o excesso de burocracia regulatória.

Todos os especialistas entrevistados pelo Desafios da Educação defendem o mesmo ponto: é preciso, sim, discutir a qualidade da modalidade a distância. Principalmente em um cenário no qual as tecnologias permitem o bom desempenho desses cursos. “Mas classificar a educação a distância como algo sem qualidade, sem embasamento e apropriação empobrece essa tão importante discussão”, afirma Raphaela Novaes de Moraes, coordenadora de negócios da +A Educação.


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O cenário do EaD fez reacender a discussão sobre a qualidade desses cursos. Crédito: Unsplash.

Os desafios do EaD

O principal desafio da educação a distância no Brasil é o acesso à internet e a tecnologias que permitam que os alunos possam participar adequadamente dos cursos online. O outro é a formação de professores, tutores, designers instrucionais e demais profissionais envolvidos.

A ABED também diz que há dificuldades em mostrar para a sociedade o que significa educação a distância, que a modalidade não implica em baixa qualidade e que há muitos profissionais competentes formados pela EaD atuando no mercado.

“Precisamos quebrar esse preconceito de que EaD é ruim”, defende Gustavo Hoffmann, especialista na área e consultor da Plataforma A. Para isso, ele defende a promoção de um modelo de educação a distância baseado em métricas e indicadores de qualidade.

Antes, é preciso entender que tipo de aluno cada uma das modalidades está atraindo. Isso ajuda a compreender a forma de ensinar esses estudantes e também a criar mecanismos de captar outros públicos.

Ouça este episódio a respeito da temática:

 Inclusão na educação superior

Uma das maiores vantagens da educação a distância é a sua capacidade de gerar inclusão. Nesse contexto, estão trabalhadores que não conseguem se deslocar para aulas presenciais e pessoas que vivem em áreas remotas. Além disso, há o fator financeiro: em geral, uma graduação EaD custa menos que um curso presencial.

Para Hoffmann, foram justamente os fatores socioeconômicos que impulsionaram o crescimento da educação a distância, mas espera que não sejam os únicos. Ele deseja que no futuro a modalidade seja também reconhecida pela qualidade de seus cursos. “A gente tem que brigar é contra a oferta de má qualidade, seja em EaD ou presencial”, afirma.

Nesse sentido, os especialistas defendem que ambas as modalidades sejam avaliadas por critérios iguais. A explicação é que, seja qual for o formato de curso escolhido, os alunos precisam adquirir as mesmas competências.


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O futuro é híbrido?

Apesar dos desafios, a educação a distância deve continuar em expansão em 2024, em função da sua capacidade de incluir as classes D e E no ensino superior. E também devido à carência de financiamento estudantil público para o presencial.

Diante disso, a oferta de determinados cursos e até mesmo de mestrados e doutorados na EaD deve ser uma discussão cada vez mais frequente — e necessária.

Os especialistas ouvidos pelo Desafios da Educação projetam que, com o passar do tempo, o formato adotado no Brasil irá mudar profundamente. “O foco da educação a distância passará a ser na empregabilidade e trabalhabilidade do egresso, e isso afetará toda sua estrutura”, defende Ryon Braga.

A expectativa é que o modelo vigente, predominantemente assíncrono, dê lugar ao modelo híbrido, com maior ou menor presencialidade em função das características de cada curso.

As afirmações ao encontro da expectativa de divulgação das diretrizes do ensino híbrido pelo Ministério da Educação. Se acontecer, isso deve movimentar bastante o sistema educacional e promover uma mudança tanto no ensino a distância quanto no presencial.

Mais tecnologia, mais interação

As apostas no hibridismo revelam a necessidade de se ter mais tecnologias educacionais no ensino presencial e mais interação física na EaD. “A partir do momento que as pessoas entenderem isso, sem dúvida nenhuma a gente vai andar a passos largos para quebrar essa grande resistência que existe em relação à modalidade”, aponta Hoffmann.

Nesse sentido, os próximos passos envolvem discutir a experiência de aprendizagem, além de investir em tecnologias que gerem mais interação humana e melhorem a aprendizagem dos alunos.

“As IES que conseguirem fazer isso certamente sairão na frente nessa corrida, enquanto as que insistem apenas em vender conteúdo – como muitas fazem também no presencial – terão dois trabalhos: captar e perder alunos”, diz Raphaela Novaes de Moraes, da +A Educação.

E prenuncia: “Se soubermos potencializar as ferramentas que temos disponíveis hoje, a educação a distância pode se tornar o principal formato de ensino superior no Brasil”.

*A diretoria da ABED entrevistada nesta reportagem é composta pelo presidente João Mattar, pela diretora de desenvolvimento científico, Vani Kenski, e pela diretora de ética e qualidade, Betina Von Staa.

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Redação
A redação do portal Desafios da Educação é formada por jornalistas, educadores e especialistas em ensino básico e superior.

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