Theresa MacPhail é professora-assistente no programa de estudos de Ciência e Tecnologia do Stevens Institute of Technology, uma universidade de pesquisa privada de Nova Jersey (EUA). Há cerca dois anos, enquanto lecionava uma das disciplinas, percebeu que a grade exigia uma aula sobre “tópicos médicos ante o olhar das ciências sociais e humanas”. Quando chegou o momento de definir uma tarefa de avaliação dos alunos, decidiu fazer algo mais inovador.
Se preferissem, os estudantes poderiam fazer trabalhos tradicionais – por escrito, como era a praxe. Ou poderiam fazer diferente – “escrever” por meio de podcast, vídeos ou até mesmo criar uma plataforma digital (como blog ou perfil em uma rede social) que reunisse os elementos da aula e ajudasse o leitor a entender melhor do tema.
“Dizer que fiquei ansiosa por tentar uma maneira inovadora de fazê-los ‘escrever’ é um eufemismo”, escreveu MacPhail recentemente, em um artigo publicado no The Chronicle of Higher Education.
“Por um lado, eu sabia que avaliar esses projetos não tão tradicionais levaria muito mais tempo do que o normal (afinal, eu posso ler mais rápido do que ouvir ou assistir) – e tempo a mais é algo que poucos professores têm. Por outro lado, eu fiquei preocupada com a qualidade dos projetos. Os alunos entenderiam os desafios de montar um podcast ou um vídeo informativo?”
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O processo
Mas como incentivar os alunos? Theresa MacPhail frisou desde o início que optar por uma forma diferente de trabalho não seria fácil. “Contei a verdade”, diz.
“Eles não podiam divagar por uma hora e esperar uma boa nota”, ela conta. Para produzir um bom material digital, o primeiro passo é fazer um storyboard do tópico. A maior parte tem que ser planejada, e não apenas improvisada. MacPhail também alertou que todos os “formatos divertidos” inevitavelmente exigiriam uma boa escrita.
“Como os alunos das gerações Y e Z recebem a maior parte das informações nesses formatos, pensei que seria gratificante e educativo se eles tentassem construir um deles. Eu esperava que trabalhassem mais se fosse algo divertido, e se o produto final fosse algo que eles pudessem compartilhar em suas redes sociais.”
MacPhail, na verdade, também sabia que aquilo faria os alunos escreverem mais e pensarem de forma mais analítica e profunda sobre os conceitos escolhidos.
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O resultado
No primeiro semestre, a maioria dos alunos de MacPhail preferiu a maneira tradicional. “Recebi apenas dois podcasts – que ficaram excelentes. E então ficou claro que os dois alunos haviam dedicado muito tempo pensando em formas de estruturar seus projetos. Tinham entrevistas, músicas e outros pequenos clipes de áudio misturado.”
Outros dez alunos escolheram criar uma plataforma interativa e adicionaram vídeos, imagens e áudios para ilustrar o que estavam escrevendo. “Eu tinha definido um limite do quanto poderia ser ocupado com essas coisas e como elas tinham de aparecer. A maioria dos estudantes foi bem, ainda que, na maior honestidade, eu tive alguns insucessos”, reconhece a professora.
No geral, a experiência foi um “sucesso parcial”, segundo MacPhail. Mas ela seguiu tentando nos semestres seguintes. E acabou adotando a abordagem em outros disciplinas. “O resultado é que cada vez mais estudantes estão deixando de lado os projetos tradicionais para os mais inovadores. E a maioria tem se saído bem.”
Segundo MacPhail, alguns céticos até podem insistir que podcasts, vídeos ou blogs não valem o mesmo que projetos tradicionais, que não são eficazes ou inteligentes. Mas vale a pena. “A maioria dos alunos que escolhem sair do padrão acabam elaborando respostas melhores porque investem muito mais tempo no projeto.”
Entre os aspectos que mais lhe impressionou está o fato de que alguns alunos que não respondiam bem às atividades tradicionais levaram a inovação a sério.
Um exemplo disso era uma turma do “fundão”, composta por quatro atletas – as competições universitárias são tradicionais nos Estados Unidos e, por isso, muitos estudantes representam as instituições de ensino superior em ligas nacionais e regionais de basquete, futebol e outros esportes. O resultado deles melhorou ao criarem projetos em formatos não tradicionais.
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Outro aluno, que não costumava participar dos debates em aula, também optou por um projeto mais inovador. Seu tema? Técnicas usadas por lutadores para perder peso rapidamente antes da pesagem para a competição e seus efeitos na saúde mental e física.
O aluno utilizou vídeos para ilustrar não apenas como as técnicas funcionavam, mas como elas eram compartilhadas nas redes sociais e como criavam uma cultura que normalizava métodos perigosos de perda de peso. Ele aplicou os conceitos vistos em aula e os usou para elaborar em cima da sua própria relação com suas rotinas de treinamento e de dieta.
“Ele disse que nunca mais esqueceria o que aprendeu em aula. E se isso não é uma grande vitória pedagógica, eu não sei o que é”, diz a professora.
Outra vitória importante é que esse tipo de metodologia dificulta que os alunos plagiem ou roubem ideias. Podcasts, vídeos ou plataformas digitais exigem que os alunos personalizem seus projetos.
“Como eu exijo que eles vinculem seus temas a pelo menos três textos que lemos em aula, é quase impossível fingir autenticidade. Embora eu tenha certeza que de ainda é possível – só que bem menos provável”, analisa MacPhail.
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Com a experiência, Theresa MacPhail concluiu que os trabalhos em formatos não tradicionais – impossíveis de fazer há uma geração – podem ter um grande impacto nas salas de aula.
Como avaliar
Ao avaliar os projetos dos alunos – e vale lembrar que ainda havia artigos tradicionais –, a professora precisou criar um modelo “justo”. Ela definiu requisitos mínimos para que cada tipo de formato. Todos os projetos tiveram que:
- entregar uma bibliografia;
- usar de três a cinco referências de textos que lemos em aula;
- e usar três conceitos discutidos durante as aulas.
“Qualquer que seja o formato, todos esses requisitos são necessários para formar um argumento coerente. E em todos os formatos, procurei recompensar a criatividade”, diz a professora.
Até hoje, nenhum aluno reclamou da avaliação. Eles entendem os desafios inerentes de cada formato.
MacPhail reconhece que precisa de mais tempo para avaliar um podcast de 45 minutos do que um artigo de 15 páginas. “Assim como outros podcasts, escuto meus alunos enquanto cozinho, limpo ou viajo, fazendo pequenas anotações para não esquecer.”
Ela incentiva os professores a não ter medo de investir nesse tipo de projeto – e a utilizar os recursos tecnológicos disponíveis nas instituições, como o ambiente virtual de aprendizagem (LMS, na sigla em inglês) e mesmo as cabines de rádio. “A universidade em que trabalho tem uma sala de gravação e equipamentos que os alunos podem reservar para trabalhar em seus projetos, tanto sozinho quanto em grupo.”
Caso sua instituição de ensino não tenha recursos, os alunos podem gravar áudio e vídeo utilizando seus celulares e notebooks. “A maioria deles já sabe como fazer essas coisas facilmente.”
A professora assistente do Stevens Institute of Technology sabe que podcasts, vídeos e blogs não são uma panaceia mágica para o desafio que é conseguir fazer com que os alunos do século 21 leiam, escrevam e pensem. E também não é o melhor modelo para todas as salas de aula ou todos os assuntos.
Mas ela testifica que essas ferramentas são oportunas para fazer com que os alunos se envolvam de forma mais profunda, analítica e crítica com assuntos. “E saber como buscar uma compreensão mais profunda de um tema, por sua vez, vai fazer os alunos serem melhores cidadãos no futuro.”
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