O professor Ricardo Fragelli, da Universidade de Brasília (UnB), apresentará na quarta-feira (10), às 17h, o webinar “Método Trezentos – Aprendizagem ativa e colaborativa para além do conteúdo”. Direcionado para educadores que querem estimular a integração em sala de aula, o evento é promovido pela Disal, distribuidora de livros e materiais didáticos para o ensino de idiomas. Clique aqui para participar.
Fragelli é doutor em Ciências Mecânicas e mestre em Engenharia Mecânica. Leciona nos cursos de Engenharia da Faculdade UnB Gama e de mestrado em Design, onde orienta trabalhos na área de Design Educacional. Detentor de diversos prêmios acadêmicos, resultado de suas pesquisas, Fragelli é autor de Método Trezentos: aprendizagem ativa e colaborativa para além do conteúdo (Penso, 2018).
Nesta entrevista, ele explica a metodologia – que já apresenta evidências de sucesso – e como os professores podem aplicá-la para favorecer a aprendizagem de seus alunos.
O que é metodologia Trezentos? É uma metodologia em que os estudantes se ajudam mutuamente por meio de grupos potencialmente colaborativos e metas cuidadosamente planejadas. Após cada avaliação de aprendizagem de uma determinada disciplina, grupos mistos são formados com estudantes com bom e baixo rendimentos nessa avaliação. As metas são determinadas para serem trabalhadas pelos grupos em um prazo estipulado.
Cumpridas essas metas, os estudantes com baixo rendimento fazem uma nova avaliação e, geralmente, melhoram suas notas, resgatando também sua autoestima e retomando o gosto pela matéria. Os estudantes com alto rendimento melhoram suas notas iniciais de acordo com a melhora dos colegas ajudados e com o nível de ajuda oferecido ao grupo, mensurado por meio de uma avaliação em 360°.
Como e por que ela foi criada? A metodologia foi criada após a verificação de que não estávamos aproveitando ao máximo a colaboração entre os estudantes e de que alguns permaneciam isolados em sala de aula, mesmo com nossos esforços com outras metodologias.
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Já existem dados mostrando sua eficácia? Sim. Temos dados que mostram aumento nas notas e na aprovação, redução da ansiedade em provas e a construção de competências inter e intrapessoais, tais como interrelação pessoal, empatia, cooperação, perseverança e valorização da diversidade. Outro resultado importante é a redução na sensação de solidão.
Muitos professores aplicam o Trezentos em diversos contextos e geralmente observam resultados semelhantes aos nossos, o que mostra que também é uma metodologia com alta replicabilidade. Em Cálculo 1, por exemplo, que é uma disciplina geralmente ministrada no primeiro semestre dos cursos de Engenharia e [outras ciências] exatas, cerca de 90% dos estudantes sentem-se mais tranquilos em provas, e aumentamos a aprovação de 50 para 95%.
Temos muitos resultados de professores de diferentes áreas, como o caso da professora Michelle Vianna, do curso de Odontologia da PUCPR, citada no livro, que mostrou a construção de empatia e resiliência de uma de suas alunas. Professores da educação básica também apresentam bons resultados na aplicação do Trezentos com crianças e adolescentes.
A metodologia foi originalmente pensada para o ensino superior. Então, é possível utilizá-la também na educação básica? Sim. Um dos grandes objetivos do livro sobre o método Trezentos é fazer a metodologia ser facilmente aplicada pelos professores da educação básica, e, com esse propósito, há um capítulo específico discorrendo sobre as possibilidades de aplicação nesse cenário.
Quanto tempo demanda a formação dos professores para sua aplicação? O tempo demandado para aplicação depende da solução escolhida, do público, do nível de liberdade do professor dentro da escola e do apoio dos gestores da instituição, podendo variar de apenas uma semana a um semestre.
O senhor propõe que os alunos sejam colocados na posição daqueles que ensinam. Por quê? Por diversos motivos. Dois deles são porque eles possuem linguajar próprio de quem está na fase de aprendizagem dos conceitos e porque, ao ensinar, atingem um nível cognitivo maior, revisitando os conceitos de um modo totalmente diferente.
O senhor afirma que a formação de grupos de estudantes por afinidades pode ser um problema para a aprendizagem. Pode explicar? A formação de grupos por afinidades é natural, deve continuar e continuará acontecendo na escola e fora dela. O problema é considerar apenas esse caminho para a formação de grupos. Além da questão dos estudantes que são isolados por não pertencerem a qualquer grupo, há também o ganho de se conviver com a diversidade em grupos construídos com base no potencial de colaboração.
Sua proposta de criar uma ferramenta voltada para a aprendizagem colaborativa poderia ser utilizada na formação docente? Sim. Já realizei dezenas de formações sobre o método Trezentos com o próprio método e tenho certeza de que pode ser alvissareiro utilizá-lo para formações sobre conteúdos diversos. Vejo várias possibilidades e, no livro, tenho duas falas que especialmente podem interessar a quem deseja aplicar o Trezentos na formação docente sobre outras metodologias e ferramentas, são elas: formação por habilidades e competências e aplicação do Trezentos sem professor. Esta última me parece muito adequada, pois é a aplicação da metodologia sem que se tenha uma disciplina específica de um curso.
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Na sua opinião, o que é preciso para ser um bom professor hoje?
Basicamente, concordo com a fala de muitos educadores que afirmam que existe um ciclo sem fim, composto por formação, ação e reflexão sobre a prática docente. Considero também que a esse ciclo devem-se adicionar alguns temperos, tais como ter uma habilidade crescente de empatia com o educando, entender todo o contexto de formação desses estudantes, compreender que estamos formando cidadãos para um mundo em que novas habilidades e competências serão necessárias, buscar soluções criativas aos novos problemas enfrentados, verificar a possibilidade de agregar novos caminhos com base na tecnologia e compartilhar suas descobertas, considerando que podem auxiliar outros alunos e professores.
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Atualmente, percebe-se um alto índice de abandono no ensino médio, em grande parte motivado pela dificuldade da escola em ser atraente para os alunos. Como o senhor acredita que esse problema pode ser enfrentado de maneira eficaz? Um dos maiores motivadores para o ser humano é se sentir parte de um grupo. Em contrapartida, quando o estudante não se sente parte da escola, perde muito de seu interesse. Outro fator de destaque é o que ocorre na sala de aula, podendo estar em descompasso com o dinamismo da vida do estudante fora da escola.
Para o enfrentamento dessa problemática, muitas instituições apostam nas metodologias ativas e colaborativas, além de dar um apoio maior aos educandos e propiciar maior significado à aprendizagem e à forma como ela é construída.
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Aprender no século XXI significa aprender de forma colaborativa? Creio que significa também aprender de forma colaborativa. Não concordo totalmente com os pensamentos de Schopenhauer, o filósofo alemão do século XIX, mas estou de acordo quando ele afirma que, quando estamos sozinhos, estamos livres. De outro modo, alguns momentos de solidão no estudo também são importantes, tanto para a criatividade quanto para a exploração e a descoberta de nós mesmos.
O problema é nos sentirmos isolados e solitários em um ambiente social, como, por exemplo, no contexto escolar. A aprendizagem deve ser composta por experiências diversas, para que possamos nos experimentar e descobrir as formas com as quais aprendemos melhor, com momentos de ação colaborativa e outros de reflexão.
Poderia explicar melhor? Para exemplificar de modo simples, basta considerar a pessoa que lê esta resposta neste exato momento. Ela está sozinha ou lendo em grupo? Ambas as situações nos levam a propostas interessantes de aprendizagem e reflexão.
Se estiver sozinha, pouco estará preocupada com sua postura ou vestimenta, provavelmente foi ela própria que procurou saber mais sobre o assunto e, desse modo, terá mais facilidade em encontrar correlações com seus conceitos prévios. Ela tentará compreender os conceitos envolvidos nesta resposta, avaliando sua capacidade de concentração, seu pensamento crítico e sua criatividade em buscar asserção de valor.
Se, por outro lado, experimentar uma leitura e discussão em grupo, provavelmente terá uma experiência muito diferente, em que serão trabalhadas outras habilidades, nem piores nem melhores, mas diferentes. Fará uma leitura em que o ambiente poderá lhe oferecer mais ou menos entusiasmo para a reflexão, além de entender e praticar outros domínios de competências, como comunicação assertiva, empatia, cooperação, resolução de conflitos, entre outras.
Que modelo de escola o século XXI necessita? Acredito que Lúcio Sêneca, filósofo nascido poucos anos antes de Cristo, nos ajuda a encontrar parte dessa resposta. Em seu livro Sobre a brevidade da vida, ele nos lembra de que o futuro é incerto, o presente é tão escorregadio que quase sequer existe, mas o passado pode ser revisitado quantas vezes quisermos, de modo seguro, e nenhuma guerra ou vicissitude humana será capaz de alterá-lo.
Desse modo, penso, inicialmente, no passado que deveríamos construir para os cidadãos do futuro, de modo que possam revisitá-lo com boas lembranças, oferecendo a segurança necessária para o enfrentamento de novos desafios.
Nesse sentido, a escola deveria ser um local sem isolamento ou solidão negativa, um espaço de alegria e aprendizagem significativa. Entretanto, ao lançarmos um olhar para o futuro, verificamos a necessidade de um estudante com maior autonomia, flexibilidade, trabalho cooperativo, metacognição, pensamento crítico, criatividade, capacidade de comunicação, resiliência, espírito de solidariedade e empatia.
Portanto, a escola do século XXI deve ser um espaço capaz de construir tais virtudes. Arrisco dizer que tal escola estaria condenada a utilizar mais do que as frágeis fronteiras físicas de seus muros e considerar metodologias que envolvam os estudantes, abraçando-os em todas as suas dificuldades e potencialidades, em um despertar de si mesmos e de outros.
A vida toda sabemos da importância das trocas de experiências dentro de sala de aula e que o professor não é o único detentor do conhecimento. Mas eis a questão: que método seguir?
Gostei muito do roteiro de estudo do método. Bem cronometrado, com as atividades de todo o curso planejado. Infelizmente, o método poderá funcionar na escola pública de início de maneira parcial. Só caminharemos, se de fato, toda a escola se comprometer com o método. Pois temos muitos professores engessados na sala de aula ainda. Para começar,a dificuldade com a tecnologia,essa que é imprescindível! E digo isso, pela própria dificuldade que tenho, com o mundo da tecnolgia. Faltam investimentos, capacitações na educação. E nesse tempo da pandemia, aprendemos muito sobre novas tecnologias dentro da sala de aula e reconheço o quanto fazem falta!
As escolas lutam muito para manter uma internet e computadores funcionando a vapor dentro da escola. Gosto do método e acredito nele. Mas seria muito bom que todos na escola falassem a mesma língua. Quem sabe o estado não adote essa moda?É hora de inovar a educação, suas salas, seus espaços e seus métodos. Esses que garantem a participação e aprendizagem significativa!
Parabéns Ricardo Fragelli, por compartilhar, tal experiência conosco: educadores.