Enciclopédias e dicionários eram itens bastante comuns no passado. Mas esse tipo de material pedagógico está caindo em desuso ano após ano, perdendo espaço para ferramentas com tecnologia embarcada, muito mais intuitivas e amigáveis (além de potentes em termos de possibilidades e conteúdos), que estão transformando o processo de aprendizagem.
Com isso, algumas metodologias de ensino estão se adaptando aos novos tempos. É o caso do ensino híbrido e da sala de aula invertida.
Ambas colocam o estudante no centro da produção do conhecimento, buscando incentivar o exercício da autonomia nesse processo. Por meio delas, os alunos são instigados a pensar e resolver problemas de forma independente e, ao mesmo tempo, compartilhada. Esse é, inclusive, um dos segredos do sucesso da Universidade Harvard, que utiliza e apoia esses métodos há mais de quatro décadas.
O ensino híbrido ou blended learning
O modelo de ensino híbrido ajuda a aproximar educadores e educandos, proporciona mais interação com o conteúdo e favorece o relacionamento entre os pares. Do ponto de vista pedagógico, todos os envolvidos passam a se sentir integrados, em um ambiente convidativo à exploração do saber.
Um ensino combinado, unindo o melhor da presencialidade e da virtualidade, garante o aprendizado em um ritmo próprio, por meio de módulos assíncronos, em que o estudante pode realizar as atividades de acordo com sua disponibilidade de tempo (mas sem deixar de lado os prazos estabelecidos pelo professor) e com suporte durante aulas presenciais voltadas a atividades práticas e colaborativas.
Com essa metodologia o aluno se organiza para aprender dentro e fora da sala de aula. Em casa, ele constrói conhecimento ao realizar atividades de maneira autônoma e acessar conteúdos disponibilizados nos ambientes de aprendizagem virtuais, utilizando fóruns e chats para interagir com a turma, os tutores e os professores para sanar dúvidas. Na companhia do professor e dos colegas, compartilha experiências e recebe orientação para seguir em frente.
Estudos recentes, como os de Kim Issroff e Charles Crook, indicam que o trabalho coletivo aumenta as habilidades cognitivas e a motivação dos estudantes, como reflexo da importância da afetividade no aprendizado. Eles também apontam que os ambientes mediados por computadores no ensino universitário trazem fatores afetivos que influenciam no êxito dessas experiências.
O hibridismo também representa uma ruptura em relação ao ensino passivo, apontado hoje como um dos principais problemas da educação. Mais do que isso, o blended learning permite potencializar o processo de aprendizagem ao incorporar no ensino as principais vantagens de cada um dos formatos.
Conforme explica em artigo o pesquisador Shan Williams, um dos maiores desafios das iniciativas do tipo é encontrar o verdadeiro equilíbrio na integração dos vários elementos (on-line e off-line) em um mesmo plano de ensino.
Definindo a frequência
A proporção entre conteúdo on-line e presencial é um ponto que precisa ser bem avaliado no planejamento de aula. Um bom canal de suporte para relacionamento entre colegas, tutores e docentes faz toda a diferença. Afinal, espera-se que eles interajam pelos chats e fóruns de discussão por um longo tempo.
No caso de um grupo de professores da Universidad Politécnica de Cataluña, na Espanha, foi escolhida uma mescla com outra metodologia ativa para alcançar esse ponto de equilíbrio: a aprendizagem baseada em problemas. Nas atividades propostas, os estudantes eram responsáveis por realizar levantamentos de dados, pesquisas e discussões que culminariam em uma apresentação oral. Foram estimulados os recursos de fórum e interação com professores e alunos no ambiente virtual.
Ao observar dois grupos, um com atividades presenciais de baixa e outro de média frequência, os pesquisadores constataram que os últimos tiveram um melhor resultado. “Foi produzido o máximo rendimento estudantil, com alta motivação e um rendimento altamente satisfatório para o docente como planejador e tutor”, relataram.
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Entendendo os quadrantes híbridos
Outra maneira de organizar a presencialidade e o ensino remoto de forma satisfatória é a utilização dos chamados quadrantes híbridos,
Os quadrantes híbridos são formados por:
- Atividades presenciais síncronas, nas quais professores e alunos interagem dentro de um mesmo ambiente ao vivo;
- Atividades presenciais assíncronas, em que os estudantes participam de atividades supervisionadas em momentos escolhidos pelos estudantes, mas sem a necessidade da presença do professor;
- Atividades virtuais assíncronas, compostas pelo modelo 100% on-line de atividades que podem ser acessadas a qualquer momento pelo estudante;
- Atividades virtuais síncronas, como as aulas remotas e os chats de tutoria, que acontecem ao vivo, mas sem que alunos e professores ou tutores estejam no mesmo espaço físico.
Não é de se estranhar que a junção dos mundos on-line e off-line seja um dos métodos de ensino preferidos dos estudantes: em 2021, uma pesquisa encomendada pela Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES) ao Educa Insights demonstrou que 55% dos universitários de instituições privadas preferia que as aulas se tornassem híbridas no pós-pandemia.
Um novo estudo realizado pelas mesmas entidades confirmou a tendência. Em 2022, houve um aumento de 43% nas matrículas em cursos híbridos, ou seja, aqueles que mesclam atividades síncronas e assíncronas, garantindo a potencialidade de cada uma das modalidades de ensino. De acordo com a Portaria nº 2.117 do Ministério da Educação, publicada em 2019, até 40% das atividades de cursos presenciais podem ser realizadas de maneira remota.
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Trocando os papéis: a sala de aula invertida
Dentro do ensino híbrido, a sala de aula invertida se destaca como um dos métodos mais utilizados ao falar em metodologias ativas. Esse sucesso tem uma causa: a sala de aula invertida dá autonomia e instiga a criatividade de todos os envolvidos no processo – estudantes, professores e tutores.
O aluno precisa acessar o conteúdo bem antes de chegar na instituição. A aula serve para colocar tudo em prática, além de se relacionar e tirar dúvidas. “Assim, o educador pode focar em atividades colaborativas e participativas”, avalia Graziella Matarazzo, pedagoga especialista em inovação.
A prática já é bem comum em escolas de idiomas, por exemplo. Suponhamos que a turma está iniciando um novo capítulo do conteúdo do livro de inglês. Em casa, os estudantes acessam a plataforma, assistem a uma videoaula e praticam exercícios durante três ou quatro dias. Ao final da semana, a professora realiza dinâmicas de jogos e conversação simulando uma situação durante o encontro presencial. Os alunos precisam se articular para responder e podem contar com o apoio uns dos outros, caso precisem de auxílio.
O objetivo da inversão é que o aluno compreenda o conteúdo antes de aplicá-lo. Assim, ele desenvolve um jeito próprio de aprender. Vale tudo, desde mapas mentais ou fichas coloridas até devorar a bibliografia sugerida na íntegra pelo tablet ou celular.
A sala de aula invertida já é utilizada em diferentes instituições de ensino superior. É o caso do Insper, em São Paulo, onde as escolas de Engenharias e Negócios contam com essa metodologia desde 1997, mesmo sem dispor de tanta tecnologia quanto na atualidade.
Para Matarazzo, a implementação das metodologias ativas não é um processo complexo, mas requer planejamento. “Existem quatro aspectos que precisam ser avaliados. O primeiro é a visão da escola sobre o uso das tecnologias; o segundo se refere às competências dos atores envolvidos; em terceiro lugar, a disponibilidade dos recursos digitais; e, por fim, a infraestrutura necessária”, avalia.
No caso da sala de aula invertida, a utilização de ambientes virtuais de aprendizagem (AVAs) pode facilitar a adesão do professor à metodologia – sem esquecer, é claro, da necessidade de capacitar os docentes para isso. O educador precisará saber inovar e explorar a criatividade dos alunos. A fluência dessa relação pode ajudar a buscar novas formas de solucionar problemas e apresentar trabalhos e, por consequência, melhorar o desempenho da turma.
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