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Paulo Blikstein: pandemia é desastre ou oportunidade de reconstruir a educação?

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Por causa da pandemia, o uso da tecnologia na educação precisou sair do discurso e ser colocado em prática. Mas a tecnologia, por si só, não vai resolver o problema educacional do Brasil. O que vai resolver? Políticas públicas bem articuladas, recursos para educação e professores valorizados e bem treinados.

“Se o docente não for melhor preparado, ele vai fingir que ensina e os alunos fingem que aprendem”, afirmou Paulo Blikstein. Ele é professor assistente na Escola de Educação da Universidade Stanford e organizador do livro Inovações Radicais na Educação Brasileira – publicada pela editora Penso (2019), com apoio das universidades Columbia (Nova York) e Stanford (Califórnia) e do Lemann Center.

Na última quarta-feira (22), Blikstein participou de uma transmissão ao vivo promovida por este portal. Você pode rever a live no Instagram do Desafios da Educação ou conferir, abaixo, os principais tópicos da conversa.

Leia mais: Livro reúne experiências inovadoras e “radicais” na educação brasileira

 

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 As heranças da pandemia

Paulo Blikstein morou dez anos no Vale do Silício, onde ampliou habilidades e conhecimentos acerca da educação personalizada. O problema é que, durante a pandemia, professores e alunos têm a sensação de que essa aprendizagem “no meu ritmo, no meu jeito e no meu sofá” é horrível. Eles a detestam.

Para Blikstein, ir à escola e participar da construção coletiva da sala de aula ainda é muito importante. Não aquela sala de aula opressiva e mau estruturada, mas a boa sala de aula, com colegas e professores que se entendem e se ajudam mutuamente.

Blikstein espera que uma das heranças da pandemia seja a valorização do professor. A outra: levar mais a sério, por uma questão de equidade, a infraestrutura tecnológica.

“Se a escola tem internet para 80% dos seus alunos, então você não tem internet para todos. Não se pode excluir 20% dos alunos apenas porque eles não têm celular, computador ou internet em casa. É um papel do Estado desenvolver mecanismos para diminuir as desigualdades sociais existentes.”

O professor em Stanford lembra que para criar bons hospitais é preciso investir dinheiro. Na educação não é diferente. “Ensinar matemática básica, ler e escrever é relativamente barato comparado com ensinar ciência, história, computação e robótica. Só que esses são os conteúdos do século 21“, afirma Blikstein.

Leia mais: Pandemia é oportunidade de repensar a formação docente

Pesquisas na educação

Na Medicina existe a pesquisa translacional, que são departamentos das faculdades que fazem o trabalho de tradução da pesquisa básica para a pesquisa aplicada, que pode ser usada nos hospitais.

Não é algo simples de executar e nós temos pouco disso na educação, segundo Blikstein. “Existe a pesquisa básica, mas há um baixo investimento na pesquisa translacional. Porque é caro, difícil, demorado. Além disso, não existe um senso de urgência em fazer isso.”

As pessoas dizem: ‘Não vou tomar um remédio que não foi comprovado cientificamente’. Mas, de forma curiosa, a gente envia nossas crianças à escola, mesmo que ela ensine por métodos que não têm comprovação científica.

Paulo Blikstein

Blikstein ressalta que isso não é culpa dos pesquisadores, mas da falta de incentivo e da tradição de financiar pesquisa educacional no Brasil. Outro problema é que, muitas vezes, os empreendedores de educação não têm muita consideração com a questão da comprovação cientifica.

Leia mais: O que vem por aí: a educação depois da pandemia

Para Blikstein a pandemia deve promover mais reconstrução criativa do que tecnologia educacional. Crédito: Reprodução.

Para Blikstein a pandemia deve promover mais reconstrução criativa do que tecnologia educacional. Crédito: Reprodução.

Escolas de campanha

O alastramento da coronavírus levou governos a construir hospitais de campanha. Talvez seja necessário pensar algo semelhante na educação – instituições voltadas à recuperação da aprendizagem perdida durante o período de confinamento.

Para Paulo Blikstein há dois caminhos. Ou as autoridades e os gestores admitem que houve uma perda de aprendizagem, recomeçam o ano letivo e reajusta todas as questões de políticas públicas. Ou organizam as instituições de ensino no estilo “escolas de campanha“: reduz o tempo de férias, contrata professores aposentados e faz uma força-tarefa junto às universidades públicas.

Não é que Blikstein defenda uma das duas ideias. Para ele, não há outras opções. “O que não pode é fingir que nada aconteceu”, ressalta o professor de Stanford. Ele ainda diz que não se pode olhar apenas as perdas, mas o que pode ser aprendido nesse momento em que os alunos estão em casa com suas famílias.

Leia mais: E se convertermos escolas e universidades em “centros seguros de aprendizagem online”?

Espaço maker

“Quando a tecnologia vem na intenção de humanizar a educação, envolver o aluno e fazer uma aprendizagem mais interessante e próxima da realidade, eu acho ela ótima”, diz Blikstein. Por outro lado, o professor mostra descontentamento quando as novas tecnologias são adotadas unicamente para substituir o professor e automatizar o processo de ensino.

Um bom exemplo: o espaço maker. Para Paulo Blikstein, trata-se de um lugar com muita tecnologia, mas que também é um ambiente onde o aluno pode criar. O objetivo do espaço maker não é apenas colocar o estudante em contato com a tecnologia. Mas que ele possa inventar coisas a partir desse contato.

Leia mais: Ambiente aberto à criatividade é um dos desafios da educação contemporânea

Adriane Kiperman
Adriane Kiperman é diretora editorial do Grupo A Educação e membro do Conselho Editorial do portal Desafios da Educação e das Revistas Pátio.

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