Por Luciano Sathler
Para refundar a nação e alimentar a esperança do povo brasileiro, as escolas e as políticas públicas de Educação terão que ser novamente imaginadas, sonhadas, pesquisadas e concebidas a partir de um olhar que mira a transformação, sobretudo no que diz respeito a Ciência, a Tecnologia e a Inovação.
Essa capacidade deve ser estabelecida desde a Educação Infantil até a universidade. Do contrário, o sistema educacional corre risco de criar “estátuas com pés de barro”, como no sonho revelado pelo livro de Daniel, na Bíblia hebraica – em meados do no Século VI a.C., o imperador de Babilônia Nabucodonosor teve um sonho acerca da queda de uma grande estátua com cabeça de ouro, peito e braços de prata, ventre e coxas de bronze, pernas de ferro e pés numa mistura de ferro e argila.
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) percebeu há alguns anos essa necessidade de investir na Educação Básica para fomentar a inovação. Em 2010, seu Centro de Pesquisa e Inovação Educacional realizou uma pesquisa-ação para desenvolver inovações para a educação STEM – acrônimo em inglês para as competências em Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática.
O projeto foi batizado de A Iniciativa Catalizadora. Consistia em uma rede com financiamento para 50 projetos de 15 países, especialmente para a Educação Fundamental 2 e ao Ensino Médio. A iniciativa motivou a colaboração internacional para ampliar, acelerar e sustentar a inovação em seis consórcios temáticos. Além de recursos em dinheiro, os beneficiados recebiam capacitação e orientação individualizada.
O princípio adotado foi que ideias e inovação podem fluir da união de pessoas de diferentes origens, regiões e campos do conhecimento. Ou seja: para avançar no sentido da inovação, fomentando fluxos de conhecimento e aprendizagem entre pares, os supervisores de políticas públicas, gestores e educadores devem promover a colaboração, inclusive em nível internacional.
A educação STEM em cinco modelos
No projeto da OCDE, as ações STEM foram organizadas em cinco modelos inovadores de ensino e aprendizagem:
- Jogos educativos
- Laboratórios online ou remotos
- Colaboração por meio da tecnologia
- Avaliação formativa em tempo real
- Alinhamento curricular baseado em competências.
A ênfase estava nas práticas que seriam difíceis de implementar sem tecnologia e que podem melhorar não apenas os resultados tradicionais de aprendizagem, mas também a motivação, atitudes, hábitos, criatividade e sua avaliação.
Nos jogos educativos, os alunos interagem com videogames, simulações ou mundos digitais baseados em lugares e sociedades imaginários ou reais, em ambientes virtuais altamente interativos. O jogo educacional também inclui projetos colaborativos baseados em projetos, experiências de aprendizagem onde os próprios participantes se tornam criadores de jogos e produtores de conteúdo.
Laboratórios online digitais permitem que os alunos simulem experimentos científicos, enquanto os remotos são utilizados por estudantes nos equipamentos de laboratórios instalados em outros locais, a distância, por meio da internet. Os laboratórios online são uma forma promissora de aumentar o acesso a uma vasta gama de aprendizagem experimental. Permite que professores e alunos tenham acesso a mais equipamentos experimentais e com maior sofisticação do que uma escola geralmente pode fornecer. Podem permitir o uso de recursos caros. Muitas dessas possibilidades estão disponíveis gratuitamente na web.
A colaboração por meio da tecnologia pode melhorar a interação, o engajamento e a aprendizagem dos alunos. Proporciona condições para o desenvolvimento da metacognição, além de aumentar a flexibilidade e a diversidade na experiência educacional.
A avaliação formativa em tempo real é significativamente facilitada pela tecnologia, por sua frequência, interatividade, a avaliação do progresso e compreensão do aluno. Clickers, computadores, tablets, telefones móveis e outros tipos de tecnologia permitem interação instantânea e trocas entre professores e alunos. Os softwares permitem que uma variedade de possibilidades seja usada para avaliação de respostas dissertativas ou por questões fechadas, discussão de perguntas dos alunos, imagens ou fórmulas matemáticas.
O uso da tecnologia para o alinhamento curricular baseado em competências pode promover uma avaliação mais precisa da variedade de competências incluídas nos currículos e padrões da educação STEM. Embora esteja se tornando cada vez mais comum desenvolver esses tipos de currículos baseados em competências, o seu eventual impacto no ensino e aprendizagem depende da disponibilidade de sistemas de suporte adequadamente alinhados. Isso é particularmente verdadeiro para as avaliações dos alunos, os recursos didáticos, orientações aos professores e desenvolvimento profissional docente.
Resultados do projeto
Como parte da pesquisa-ação Iniciativa Catalizadora, foram depreendidas algumas considerações a serem levadas em conta para se adotar novos modelos de ensino e aprendizagem com ênfase em STEM. Diferentes inovações apoiadas pela tecnologia na educação STEM ainda tendem a ser marginais nas escolas. Trazê-las para a prática predominante depende da disponibilidade dos recursos técnicos e suporte para os mesmos.
As propostas precisam ser compatíveis com o contexto local e as estruturas educacionais presentes. Também é importante propiciar aos profissionais suficiente capacitação, apoio administrativo e político, bem como liberar tempo para implementação. As questões a serem levadas em consideração incluem:
- Conscientização sobre as possibilidades de novos modelos e tecnologias;
- Complexidade superestimada, por conotações de dificuldade ou frivolidade que impedem alguns professores. No entanto, a colaboração virtual não requer necessariamente tecnologia muito sofisticada. Da mesma forma, o uso de alguns laboratórios online pode apenas requerer acesso à internet;
- Falta de equipamentos e recursos financeiros. Um obstáculo ao uso de aprendizado intensificado em tecnologia está na deficiência de equipamentos, conexão e suporte técnico que ainda caracteriza muitas escolas. Algo perfeitamente solucionável no Brasil se houver uma melhor gestão e ampliação do combate à corrupção;
- Compatibilidade com as estruturas educacionais. Em alguns casos, a natureza inovadora da educação STEM são dificultados dentro das estruturas educacionais existentes. Um fator de sucesso para o trabalho de dois terços dos projetos da Iniciativa Catalizadora foi a disponibilidade de recursos educacionais adequados, conteúdos e capacitação;
- Desenvolvimento profissional. Uma barreira comum à adoção de novos modelos de ensino ou recursos residem na falta de desenvolvimento profissional, incluindo formação formal de professores e aprendizagem entre pares;
- Tempo disponível para tentar novas abordagens. Não se leva em conta a falta de tempo dos professores para procurar novos recursos e informações ou para ter capacitação formal e informal.Considero inspirador o exemplo da atuação em consórcio, com projetos por tempo determinado, métricas claras para acompanhamento dos processos e resultados. Fica a dica: a pesquisa aplicada pode colaborar muito com a mudança necessária na educação brasileira.
Sobre o autor
Luciano Sathler é PhD em Administração pela FEA/USP, reitor do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix e diretor da Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed), além de curador do site Inovação Educacional.
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