O período pós-pandemia deve criar um novo consumidor, um novo mercado e um novo perfil profissional. A forma de trabalhar será diferente. E, para atender a demanda, a educação também precisa se diferenciar. Quais são os cursos que oferecerão as melhores oportunidades? E como o estudante fará sua escolha a partir de agora?
O cenário ainda pode surpreender. Mas, até o momento, é possível observar de forma empírica que os analistas estavam certos quando previram que a demanda dos próximos anos seria por inovações tecnológicas.
Mais do que revelar novas tendências, a pandemia está acelerando aquelas que já vinham se desenhando. Na prática, o coronavírus fez o amanhã chegar mais cedo.
Saúde e Negócios em alta
Em 2010, o ProFuturo, programa de pesquisa do futuro da Fundação de Instituto de Administração (FIA), divulgou um relatório apontando que a partir de 2020 haveria uma demanda crescente por bioinformationists (profissionais que trabalham com genética e vacinas), técnicos em telecomunicações e especialistas em e-commerce.
O estudo também indicava uma ascensão dos segmentos ligados ao meio ambiente, à globalização, à qualidade de vida e à virtualização.
Daniel Infante, sócio-diretor da consultoria Educa Insights, projeta uma conjuntura semelhante. “O campo da Saúde, com certeza, é um dos que mais vai crescer após a pandemia. Vamos estar mais atentos a questões de saúde pública e o envelhecimento da população mundial também vai pesar.”
Não à toa uma das maiores editores da área da saúde no Brasil, a Artmed, lançou o Artmed360. Trata-se de uma plataforma de cursos digitais onde são reunidos o conteúdo de diversas sociedades científicas, hospitais, universidades e todo conhecimento desenvolvido pela Artmed ao longo de 47 anos.
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De acordo com o especialista em pesquisa e análise de mercado, outra área que passará por um boom é a de Negócios.
“A ênfase estará nas estratégias de gestão. Na realidade pós-pandemia, será essencial fazer uma boa administração das equipes, das finanças e da imagem das empresas. O campo dos Negócios vai abrir espaço para quem souber lidar com desafios complexos de gestão”, diz Infante.
Ele, entretanto, não acredita que uma área específica determinará a graduação do futuro. Segundo o empresário, a escolha do curso será mais influenciada pelas oportunidades que a instituição de ensino superior pode oferecer do que pelos campos em expansão.
Não é como se fossemos ver o surgimento de novas graduações ou uma migração em massa para um ramo em particular, e sim uma adaptação e atualização dos currículos e das metodologias de ensino das IES.
Infante explica que a opção dos alunos, então, será definida pelo sucesso das faculdades e universidades na missão de aproximar a tecnologia e a inovação do aprendizado tradicional. Essa necessidade de modernização pode significar um aumento na competitividade entre as instituições – e, principalmente, currículos mais heterogêneos.
Graduação do futuro
No Brasil, as IES estão sujeitas à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9394/96), que impõe normas gerais para a elaboração dos currículos acadêmicos. As diretrizes foram criadas para garantir o pluralismo das concepções pedagógicas, o padrão de qualidade do ensino e condições igualitárias para todos os estudantes. Mas elas não impedem que as IES moldem o conteúdo curricular conforme seu entendimento.
É nesse movimento que o sócio da consultoria Educa Insights aposta. O curso de Direito, hoje o maior do país em número de alunos, ilustra bem essa tendência.
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Em um cenário pós-pandemia, com uma grande demanda por renegociação de contratos, mudanças na legislação de direito público e resolução de conflitos originados no ambiente virtual, terá vantagem a instituição que conseguir incluir essas temáticas e abordagens na sua grade curricular.
“É claro que as demandas já conhecidas vão seguir existindo. No caso do Direito, sempre vamos precisar de alguém que saiba como conduzir um processo padrão, mas isso todas as IES ensinam. A busca será pelo diferente: por uma faculdade que prepare o universitário para trabalhar com direito da internet, por exemplo”, diz Infante.
Ainda de acordo com o empresário, o que acontecerá é uma imersão dos conteúdos que antes competiam apenas aos cursos de tecnologia, como Ciências da Computação e Engenharia de Software, em todas as diferentes áreas do conhecimento.
Assim, o curso do futuro é aquele que oferece uma experiência mais completa e próxima da realidade do mercado de trabalho – com aulas práticas, metodologias ativas de ensino e aprendizagem e conteúdo em sintonia com as necessidades do momento.
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Atualização dos currículos
Essas mudanças serão ainda mais evidentes na área de maior valorização: a Saúde. “Algo que podemos esperar de um currículo moderno seja na Medicina, na Enfermagem ou na Odontologia, é a atenção com os idosos”, continua Daniel Infante, da consultoria Educa Insights.
O especialista alega que esse será um tema cada vez mais presente no ensino superior. “A cada ano, a população mundial aumenta sua expectativa de vida. Esse com certeza será um foco de estudo para vários campos: vamos precisar de experts na saúde de idosos, consultores de aposentadoria e até profissionais que saibam vender para esse público”, afirma.
Outro tópico que marcará presença nas grades curriculares é a pauta ambiental. “Um engenheiro vai precisar entender como o seu projeto impacta o meio ambiente a curto, médio e longo prazo, e conhecer os softwares mais avançados para identificar as melhores e mais modernas formas de realizar a obra.”
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Um publicitário, por sua vez, vai precisar dominar o assunto para criar uma campanha adequada aos novos parâmetros ético-ambientais. Será comum vermos cada vez mais profissões como gestor de energias renováveis e gerente de eco-relações.
A virtualização não ficará de fora. Nenhum campo do conhecimento chegará à era pós-pandemia sem se tornar mais digital. Para Infante, a crise gerada pela covid-19 transformou a presença no universo online em condição obrigatória para qualquer serviço.
“Agora, tudo o que fizermos tem de ser pensado a partir da lógica digital. Não dá mais para insistir apenas nos modelos tradicionais offline. Tudo pode ser transformado em dados, e todas as áreas tem como explorar esse potencial”, diz. Isso se aplica até a nutrição: teremos consultas online e monitoramento virtual das compras dos pacientes com diabetes, por exemplo.
A perspectiva, enfim: não se trata de uma graduação do futuro, mas de várias graduações – ou de áreas mais promissoras do que outras. De toda forma, o mercado estará mais conectado, mais competitivo e com demandas mais específicas. Também é verdade que vamos continuar precisando de bons profissionais nas demais áreas, estejam elas em ascensão ou não. Não será uma revolução de cursos, mas, principalmente, uma revolução nos cursos.
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