Nos últimos anos, a onipresença da internet e a chegada dos nativos digitais às universidades deram impulso a modelos disruptivos de aprendizado, que utilizam o ambiente virtual e o ensino online como base. Entretanto, ainda há uma gama considerável de professores não-convertidos à inovação e resistentes ao ensino online. É o caso do professor de inglês Christopher Schaberg, da Loyola University New Orleans.
Em março passado, Schaberg publicou um artigo polêmico no site Inside Higher ED em que, além de vestir a camisa do aprendizado presencial, critica a falta de contato com os alunos e o suposto individualismo do ensino online. “A educação online é vendida como uma receita para o sucesso individual, uma espécie de conquista platônica”, escreveu o docente.
Schaberg parece fazer parte de uma minoria no campo acadêmico. Uma pesquisa realizada pela Educause, associação sem fins lucrativos dedicada ao fomento da educação por meio das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), apontou que 71% dos docentes do país consideram como o melhor modelo de aprendizado o ensino híbrido – sistema capaz de combinar aulas online e offline. A metodologia também é a predileta por 79% dos alunos entrevistados.
A questão é que a mesma pesquisa indicou que 45% dos professores não consideram eficaz a aprendizagem estritamente virtual. Mais: um terço dos diretores e gestores norte-americanos classificam o ensino online como inferior à instrução em sala de aula, de acordo com um levantamento organizado pelo Babson Survey Research Group. O mesmo estudo descobriu que o modelo não é entendido como legítimo por dois terços das faculdades dos EUA.
Esse ceticismo está entre os principais entraves à consolidação dos novos métodos educacionais. “O corpo docente que atua online é diretamente afetado, pois o ceticismo significa que seu ensino não é respeitado, apoiado ou reconhecido”, afirma Shannon Riggs, diretora executiva de inovação em aprendizagem da Oregon State University Ecampus, ao Inside Higher ED.
Campo de possibilidades
Vencer a resistência ao ensino online requer um entendimento prático dos benefícios trazidos pelo método. Isso é o que defende Darin Kapanjie, diretor acadêmico de MBA Online da Temple University, dos EUA. Ele próprio torcia o nariz para o aprendizado virtual, mas venceu o ceticismo ao perceber as experiências de colaboração e interatividade proporcionadas pelo modelo.
“O ensino pela internet abre oportunidades que simplesmente não são possíveis no cenário presencial. Hoje me sinto mais perto dos meus alunos online do que quando em sala de aula”, destaca Kapajie. “Os céticos permanecerão céticos se não experimentarem o que é estar envolvido em um ambiente de aprendizado colaborativo.”
Joseph Scuralli, reitor online da Berkeley College, pensa da mesma forma. Ele sugere que o uso de ferramentas virtuais seja estimulado pelas instituições. Uma das formas de fazer isso é implementar um sistema de gerenciamento de aprendizado – o famoso LMS. “A versatilidade e os recursos do LMS e de aplicativos associados podem entusiasmar o corpo docente em relação ao aprendizado online”, aconselha Scuralli.
Já Benjamim Bedersob, reitor associado da Universidade de Maryland, diz que a antipatia ao aprendizado virtual pode ser vencida pelo argumento dos benefícios revertidos aos estudantes. “Nunca iremos impor uma abordagem aos professores, mas os desafiaremos com as evidências sobre o que sabemos ser eficiente ao aprendizado do aluno”, esclarece Bederson.
Desafio da formação
No Brasil, a resistência ao ensino online também recebe atenção. O tema ganha importância em razão das projeções feitas para o país. De acordo com um estudo realizado pela Sagah, empresa desenvolvedora de conteúdo e tecnologia para Educação a Distância (EAD), o ensino superior na web corresponderá a 51% do mercado em 2023.
Já um levantamento organizado pela empresa de pesquisa NZN Intelligence revelou que 90% das pessoas entrevistadas aceitariam fazer um curso online em algum momento da vida – e 61% delas já haviam assistido a aulas na web. Com base nesses dados, a postura refratária dos docentes em relação aos métodos virtuais de educação pode ser considerada disfuncional.
Na prática, os professores devem ser incentivados a perder o receio de lecionar no ambiente online. A chave para isso está na assimilação de uma metodologia adequada. “O segredo para o sucesso não está no conteúdo apresentado, mas no método pelo qual a informação é ministrada”, ressalta Rena Palloff, doutora em Sistemas Humanos e Organizacionais e professora da Fielding Graduate School (EUA), em texto publicado na Revista Pátio.
Outro ponto importante é o entendimento da postura descentralizadora do professor. No ensino online, o aprendizado é construído em parceria com o aluno. A evolução dos conteúdos é guiada pelo próprio estudante e segue um ritmo personalizado. O docente, assim, assume a condição de um facilitador, responsável por zelar pela condução do processo educacional. Por isso, os diversos meios de interação com os aprendizes são tão importantes.
A quebra de paradigma, no entanto, requer um tempo de assimilação. “Alguns estudos demonstram que se trata de um movimento gradativo e que se processa em etapas, até que seja possível alcançar uma ação crítica e criativa do professor na integração das tecnologias digitais”, explica Lilian Bacich, doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano, também em artigo à Revista Pátio.
Nesse caso, os centros de formação de futuros docentes exercem um papel fundamental.
As universidades devem começar, gradualmente, a preparar levas de profissionais adaptados aos novos modelos de ensino. Do mesmo modo, as instituições também podem oferecer estímulos aos professores já formados. Isso inclui a organização de simpósios, conferências e cursos de especialização sobre o tema, além de investimentos diretos para capacitação instrutiva do aprendizado digital.
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