Cada vez mais brasileiros estão indo estudar na Argentina, sobretudo nos cursos de Medicina – publicou recentemente a BBC News Brasil. Basta ver os números: dos cerca de 4 mil alunos de Medicina na Universidade Nacional de Rosário (UNR), por exemplo, 1,5 mil são brasileiros. Até 2015, a média na UNR era de 300 alunos. Nesse mesmo ano, a faculdade de Medicina da Universidade Nacional de La Plata (UNLP) tinha 11 brasileiros. Hoje são 566.
Quais as razões para esse efeito migratório? A primeira delas é a não exigência do vestibular.
Seja para ingressar numa instituição de ensino superior privada ou particular na Argentina, o estrangeiro precisa apenas de um visto de estudante chamado DNI, emitido facilmente pelas autoridades migratórias, e do diploma do Ensino Médio – desde que reconhecido pelos ministérios da Educação de ambos os países. Não são avaliadas as notas obtidas durante a etapa escolar, tampouco a proficiência em espanhol.
A crise na economia brasileira também impulsionou a emigração. Isso porque, em média, as universidades privadas da Argentina têm mensalidades mais acessíveis em comparação às brasileiras. Aqui, o aluno de uma faculdade particular de Medicina paga a partir de R$ 3,5 mil, mas em algumas instituições esse valor supera os R$ 7 mil. Por outro lado, na faculdade Barceló, em Buenos Aires, são cobrados 7,5 mil pesos – ou seja, cerca de R$ 1,2 mil.
No que diz respeito às universidades públicas, outro diferencial: é mais em conta pagar hospedagem, transporte e alimentação para estudar na Argentina do que arcar com o curso no ensino privado brasileiro. Ademais, as universidades públicas do país vizinho não têm limite de vagas para diversos cursos, incluindo Medicina – outro atrativo incontestável.
“É interessante contar com alunos estrangeiros, porque a troca é enriquecedora”, avalia Hector Floriani, reitor da UNR. “Mas depende da quantidade de alunos. Mil e quinhentos [alunos brasileiros] é um número elevado.”
O fato de os estrangeiros estudarem gratuitamente e depois regressarem a seus países de origem, sem uma retribuição à sociedade, também é discutido localmente. Para o decano da Faculdade de Ciências Médicas da UNR, Ricardo Nidd, porém, essa é uma “mentira xenófoba”. “Em uma economia social construída a partir do imposto de consumo, qualquer [cidadão estrangeiro] que consome aqui contribui para o tesouro”, rebateu.
Em 2015, ano do levantamento mais atualizado, os estrangeiros representavam apenas 2,8% do total de matrículas – na Austrália, por exemplo, esse indicador chega a quase 30%. Dos 1,9 milhão de universitários, 53 mil eram de fora – a maioria (90%) de países latino-americanos e 67% estudavam em universidades públicas. O ranking de estrangeiros é puxado pelo Peru, com 10,3 mil estudantes. O Brasil vem na sequência, com 7,2 mil.
Quantos brasileiros optaram por estudar na Argentina
Matrículas em IES pública: 4153
Matrículas em IES privada: 3093
Fonte: Departamento de Información Universitaria del Ministerio de Educación de la Nación Argentina. Base 2015.
Embora uma quantidade crescente de estudantes esteja na Argentina em busca de diploma, sobretudo em Medicina, nem todos conseguem validá-lo facilmente no Brasil. Desde 2011, o Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos Expedidos por Instituições de Educação Superior Estrangeira, conhecido como Revalida, reprovou ao menos uma vez 47,4% dos 7.821 médicos que fizeram a prova. E, sem a aprovação no Revalida, os formados no exterior não podem atuar na medicina brasileira.
Apesar disso, o diretor executivo da Associação Brasileira das Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), Sólon Caldas, defende o intercâmbio. “Os benefícios vão além do campo acadêmico e educacional, abrange aspectos sociais e culturais”, diz.
O reitor da UNR não questiona os benefícios. Mas, no caso brasileiro, lamenta a inexistência de um sistema de reciprocidade. “Não imagino que uma universidade federal brasileira receba 1,5 mil alunos argentinos”, diz Floriani.
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