No último dia de Desafios da Educação Talks 2024, uma sessão exclusiva para parceiros da Plataforma A mostrou como a flexibilização do ensino superior virou um caminho incontornável.
Realizado nesta quinta-feira (28), o painel “EaD em diferentes países: Case Tec de Monterrey e UCPel” reuniu três especialistas latino-americanos para discutir como a educação mediada por tecnologias tem se apresentado em cada região.
Entre os participantes estavam o mexicano Luis Fernando Mirabal, líder do IFE Living Lab do Instituto Tecnológico de Monterrey, e o peruano Héctor Escobar, diretor regional acadêmico para Espanha e América Latina da Plataforma A. O fechamento do Dia do EaD contou também com a presença de Patrícia Giusti, diretora de educação a distância da Universidade Católica de Pelotas (UCPel).
A mediação ficou a cargo de Vinicius Dias, CEO da Algetec, fornecedora de bancadas didáticas e laboratórios virtuais para o ensino presencial, EaD e híbrido.
Da lousa à nuvem: a reinvenção da educação no México
Após ser apresentado, Luis Fernando Mirabal traçou um panorama sobre a evolução da EaD no México. Três marcos definiram esse caminho.
O primeiro foi em 2017, com o Acordo 286, da Secretaria de Educação Pública (Sep). A medida deu reconhecimento oficial aos conhecimentos adquiridos fora do sistema tradicional.
Essa iniciativa não apenas abriu a porteira para novas formas de ensino, mas facilitou a integração de milhares de jovens no Sistema Educacional Nacional e no mercado de trabalho. Estavam firmados os alicerces para a EaD no mais populoso país da hispanofonia.
Dois anos depois, em 2019, veio o segundo movimento. A reforma da Lei Geral de Educação oficializou a educação online como uma modalidade válida em todo o território mexicano. Esse novo arranjo deu às IES o respaldo necessário para alinhavar suas iniciativas digitais.
Então, em 2020, o mundo parou. Com a chegada da pandemia, o ensino online deixou de ser uma opção futurista para se tornar uma questão de sobrevivência. Com o vírus à solta, 93% das escolas foram obrigadas a recorrer a essa modalidade para evitar um ano perdido. Foi nesse cenário que surgiu o programa Aprender em casa, uma resposta emergencial que, entre 2020 e 2023, garantiu a continuidade da educação básica para milhões de alunos através de televisão, internet, rádio e livros didáticos.
Superada a contingência, o México segue apostando na flexibilização curricular e acadêmica para concretizar seu Plano Nacional de Desenvolvimento.
Entre as estratégias empregadas está o programa Kitana, que trabalha para integrar tecnologia digital em todos os níveis de ensino. Outro destaque é a Programa de Conectividade em Locais Públicos, criada pela Secretaria de Comunicações e Transportes (SCT) para ampliar o acesso a plataformas e ferramentas tecnológicas, conectando mais estudantes ao aprendizado digital.
Essas ações têm sido fortalecidas por parcerias público-privadas. Grandes empresas de tecnologia e inovação, como Google e Microsoft, trabalham em sinergia com a Sep para capacitar estudantes. O objetivo é ampliar a inclusão digital e modernizar o aprendizado.
Monterrey na vanguarda
Segundo Mirabal, o Tec de Monterrey está na dianteira dessa transformação. A cada ano, a instituição expande seu portfólio de cursos EaD, com licenciaturas, bacharelados e especializações destinadas a mexicanos e estrangeiros.
Para alcançar ainda mais pessoas, o Instituto dispõe de microcertificações gratuitas em plataformas como Coursera e edX, conhecidas pelo formato de MOOCs (Massive Open Online Courses).
Em verdade, a lógica de badges já faz parte do cotidiano do Instituto. o Centro de Avaliação e Credenciais Alternativas, explica Mirabal, reconhece o desenvolvimento das competências dos alunos. Ao final de seus estudos, os graduados podem gerar credenciais e insígnias digitais que atestam suas habilidades perante empregadores e instituições ao redor do mundo.
Essa preocupação com a trabalhabilidade está alinhada ao Modelo Educativo Tec21, uma proposta para capacitar profissionais para os desafios do século. Implementado integralmente a partir do ciclo escolar 2019-2020, o modelo se sustenta em quatro pilares:
Aprendizagem baseada em desafios
Os alunos são expostos a situações reais que exigem a aplicação de conhecimentos e habilidades para desenvolver soluções criativas e estratégicas.
Flexibilidade no aprendizado
O currículo permite que os estudantes personalizem sua formação, escolhendo disciplinas e projetos que alinhem com seus interesses e objetivos profissionais.
Experiências memoráveis
O modelo promove vivências significativas que enriquecem o processo educativo, como semanas temáticas e semestres focados em projetos específicos.
Professores inspiradores
Educadores atuam como mentores, guiando e motivando os alunos na construção de seu aprendizado.
De acordo com o engenheiro físico e coordenador do Living Lab, esses elementos se combinam para desenvolver competências sólidas e integradas. Espera-se, assim, que os alunos se tornem solucionadores de problemas do mundo real. Para tanto, esses desafios não ficam no papel — são vividos na pele. “O Tec21 adota uma abordagem de aprendizado em rede, onde os desafios são resolvidos por grupos interdisciplinares de estudantes em colaboração com um ‘sócio-formador’, geralmente uma empresa ou entidade externa”, esclarece.
Essa lógica de cooperação ganha asas com o Global Shared Learning Classroom, que transforma salas de aula em conexões vivas que atravessam fronteiras. A iniciativa conecta estudantes de diferentes partes do mundo, promovendo trocas culturais e a construção de conhecimento global. “Imagine estudantes no México trabalhando com colegas no Brasil, cursando a mesma formação e colaborando na resolução de problemas reais”, exemplifica.
Evidentemente, não se trata de tecnologia pela tecnologia. O sistema universitário multicampi tem como objetivo redefinir a relação educador-educando. E faz isso como tem que ser: colocando o aluno no centro.
Um facilitador desse processo, explica Mirabal, é o metaverso, onde mais de 6.000 estudantes participam de aulas e interações sociais por meio de avatares personalizados. A instituição também utiliza projeções holográficas para aulas remotas, aproximando professores e alunos de diferentes locais em interações que simulam a presença física.
O Tec de Monterrey também tirou uma lasquinha da revolução do momento. O ecossistema baseado em IA generativa criado pela prestigiada universidade privada mexicana se chama TECgpt. Mas este não é como os outros. Alimentado por informações internas, o sistema garante a lisura do conteúdo ao monitorar interações problemáticas.
A privacidade dos dados, cabe ressaltar, é tratada com rigor. As interações dos alunos são usadas para personalizar o assistente de ensino. Mas somente com consentimento prévio. Já no chat administrativo, as conversas permanecem anônimas.
Tudo isso retorna em conhecimento para a instituição. “Estudar os cenários de aprendizado, tanto nas plataformas de educação quanto nas interações dos usuários nessas plataformas, nos ajuda a aprimorar a experiência educacional e a melhorar o desempenho dos estudantes”, sintetiza Mirabal.
Por fim, o professor compartilhou uma notícia empolgante: o Experiential Classroom, um espaço modular de 165 m² equipado com tecnologias multimodais para pesquisa educacional, será inaugurado em 2 de dezembro.
Localizado no quarto andar do edifício Expedition, o ambiente permitirá que pesquisadores, professores e empresas conduzam estudos experimentais, analisando interações e comportamentos em diversos cenários de aprendizagem.
O espaço oferece mais de 15 tecnologias de ponta para capturar dados em múltiplas modalidades, como postura, gestos, atenção, emoções e biomarcadores. A ideia é proporcionar, talvez pela primeira vez, uma visão realmente 360º da experiência do aluno.
Entre fronteiras: Héctor Escobar reflete sobre a educação a distância na América Latina
Na sequência, o diretor acadêmico regional para América Latina e Espanha da Plataforma A, Héctor Escobar, trouxe à mesa um olhar aguçado sobre as nuances que diferenciam — e, em alguns aspectos, unem — as realidades educacionais dos países latino-americanos.
Com um olhar clínico e a experiência de quem participa ativamente da transformação digital no ensino superior, o gestor acadêmico destacou os contrastes entre os países, dividindo a América Latina em dois grupos principais.
O Brasil ocupa uma posição privilegiada. “Aqui, o mercado de trabalho já aceita muito bem o jovem que opta pela educação a distância. Não há mais questionamento quanto à validade dos diplomas emitidos pelas universidades nesse formato”, explicou. Esse amadurecimento se reflete em um cenário em que tecnologia, regulamentação e aceitação caminham juntas, consolidando o Brasil como líder no uso de EaD na América Latina.
Ao lado do Brasil, Escobar destacou um conjunto de países que seguem evoluindo no ensino virtual: México, Peru, Colômbia, Argentina e Chile. “Esses países têm regulamentações robustas e iniciativas acadêmicas sérias, algumas já usando tecnologia de forma marcante, enquanto outras começam a construir esse caminho.”
O grupo se destaca pela educação virtual como um caminho para democratizar o ensino superior. “Estamos falando de jovens que precisam conciliar trabalho e estudos, pois não têm o suporte financeiro da família para se dedicarem exclusivamente à formação. Para eles, a EaD é não só uma boa solução, mas muitas vezes a única alternativa para viabilizar uma carreira.”
Um segunda ala enfrenta barreiras mais rígidas. O especialista destacou o caso de países menores da América Central, como Honduras e El Salvador, e de partes da América do Sul, como a Bolívia, onde as regulamentações para EaD são escassas.
Em muitos casos, o ensino virtual é limitado a programas de educação continuada ou pós-graduação. “Nesses países, a falta de regulamentação dificulta o avanço da tecnologia nas universidades, que muitas vezes não têm capacidade de investimento ou apoio governamental para superar essas limitações.”
Escobar trouxe um exemplo recente do Equador, onde uma instituição realizou uma pesquisa interna sobre a aceitação de ferramentas digitais. O resultado revelou uma divisão marcante entre professores mais jovens, ávidos por tecnologia, e um grupo mais tradicional, que encara a digitalização com resistência.
Para Escobar, a adaptação ao EaD não depende apenas de regulamentações ou investimentos em tecnologia. O foco deve se estender à disposição das instituições e dos próprios educadores em adotar novas metodologias e abordagens de ensino.
Assim como Mirabal, o gestor destacou que, durante a pandemia, muitas universidades foram obrigadas a adotar soluções digitais, mas nem todas mantiveram o incremento. “Vimos instituições que deram um salto na modernização, enquanto outras sacrificaram seus estudantes por falta de preparo e, ao término do distanciamento, abandonaram completamente as ferramentas digitais.”
Um ponto de virada para a educação: o futuro em jogo?
Quando Patrícia Giusti, diretora de educação a distância da UCPel, iniciou sua fala, ficou evidente que a trajetória da EaD no Brasil está longe de ser linear. Com anos de experiência liderando a implementação de cursos a distância na instituição, Patrícia mesclou dados nacionais e insights locais, com uma dose de otimismo equilibrada pela realidade de desafios complexos.
“Hoje, temos mais de 3 milhões de matrículas no ensino superior a distância”, começou Patrícia, trazendo números que refletem a relevância desse modelo de ensino no Brasil. “São mais de 1.600 cursos de graduação oferecidos por mais de 200 instituições de ensino superior, com cerca de 75% das vagas concentradas na rede privada.”
Ainda assim, Patrícia fez questão de contextualizar o cenário atual da EaD, lembrando o histórico de altos e baixos. Ela retomou a metáfora usada por João Vianney no primeiro dia de evento: a montanha-russa da educação a distância no Brasil, que teve início em 1995, enfrentando dificuldades nos anos seguintes. Foi alçar voo em 2017, quando as instituições conquistaram mais autonomia por meio de regulamentações. “Agora, em 2024, estamos vivendo um momento bastante dificultoso”, afirmou.
Patrícia então voltou sua atenção para a trajetória da UCPel, destacando a evolução da instituição desde 1999, quando começou a explorar a EaD com atividades extracurriculares e cursos livres. “Foi em 2014 que demos um passo importante, trabalhando no credenciamento para oferecer cursos a distância com autonomia e regulamentação. E, em 2017, lançamos nosso primeiro curso interno de EaD, ampliando o portfólio com parcerias estratégicas”, continou.
- Faça o download do case de como a UCPel mudou a sua forma de lecionar com o LXP da Plataforma A.
Entre os recursos estão a SAGAH, que fornece conteúdos estruturados para as unidades de aprendizagem, e a Biblioteca Digital para Ensino Superior, com obras e autores de referência nacional e traduções de bestsellers internacionais. Existem ainda os laboratórios da Algetec, que oferecem soluções imersivas para o aprendizado.
Patrícia também enfatizou o papel do Campus Digital para abraçar pessoas que foram historicamente excluídas. “A inclusão é uma questão recorrente no ensino superior, e vemos nesse espaço ferramentas poderosas para apoiar cenários diversos, garantindo que ninguém fique para trás”, relatou.
Ao encerrar a fala, Patrícia apontou que, embora o Campus Digital seja uma conquista importante, o fator humano continua sendo crucial. “Os professores mais jovens têm maior familiaridade com tecnologia, mas, mesmo eles, ainda precisam de educação continuada para usar as ferramentas de maneira estratégica, de modo a atender às necessidades dos alunos.”
Quer aprofundar a sua experiência? Confira abaixo o primeiro e o segundo seminário do Dia do EaD:
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