Conhecido por sua característica conservadora, avessa a mudanças, o mercado jurídico se rendeu à tecnologia e à inovação. Principalmente por meio das lawtechs. Exemplos não faltam para ilustrar a transformação acelerada pela pandemia da covid-19.
O uso de sistemas para digitalização de arquivos, gestão inteligente de contratos e videoconferências cresceu em tribunais e escritórios de advocacia. Na academia, após anos de debate e espera, a expectativa é inaugurar o curso de Direito EAD (modalidade de ensino a distância), ainda inédito no sistema federal de educação.
Movimentações como essa impulsionaram as chamadas lawtechs. De acordo com a Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs (ABL2), o número de startups específicas da área do Direito mais que triplicou nos últimos anos. Se em 2015 havia 42 empresas no setor, agora são mais de 150.
Já o investimento de risco no setor jurídico saiu de menos de US$ 1 bilhão por ano, em 2018, para mais de US$ 4 bilhões por trimestre em 2021, de acordo com um artigo publicado no site da revista Forbes.
“Estamos vivendo a era da exponencialidade”, afirma o diretor executivo da ABL2, Daniel Marques. “Em poucos meses, vivemos o que demoraria uma década em termos de inovação jurídica.”
Lawtechs e ensino jurídico
À sombra do sucesso das fintechs, as startups de serviços financeiros, e das edtechs, de educação, as lawtechs passaram quase despercebidas nos últimos anos. Não por acaso: até pouco tempo, a categoria enfrentava resistência dos próprios profissionais do Direito. O resultado é que o setor jurídico tem estado em grande parte isolado das mudanças impulsionadas pela tecnologia em comparação com outras áreas.
Mas, em meio à pandemia, o setor jurídico deu o braço a torcer. Com escritórios e órgãos públicos fechados, e os desafios do trabalho remoto, o Direito se viu obrigado a buscar soluções digitais que atendessem a demanda de maneira rápida e eficiente. Isso mudou os serviços, mas também o ensino jurídico.
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Desse ponto de vista, o avanço das lawtechs só foi possível graças ao amadurecimento do mercado das startups de educação – que inclui soluções como bibliotecas, ambientes de aprendizagem e laboratórios virtuais. Conforme o Mapeamento Edtech, 63,8% das edtechs mantiveram ou aumentaram seu faturamento no ano de 2020 – e 40% aumentaram o volume de contratações no período.
Segundo Emerson Luiz de Castro, que é presidente da Comissão de Educação Jurídica da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em Minas Gerais, o ensino jurídico entrou de vez no digital.
O ambiente que mais se aproveita dessa ruptura é o de práticas jurídicas institucionais. Castro explica que o núcleo de prática jurídica é uma peça importante principalmente em situações reais ou simuladas – onde o aluno é desafiado a validar e conferir o desenvolvimento das habilidades e competências previstas no projeto pedagógico do curso. Era o tipo de coisa que, antes da pandemia, se fazia apenas de forma presencial.
“A presencialidade é importante, mas só em alguns momentos”, diz Castro. E acrescenta: “A própria prática jurídica atual nos escritórios foi virtualizada. Audiências, processos judiciais e até as reuniões com clientes são virtuais. Então, a pandemia trouxe um novo cenário tecnológico ao Direito e à educação”.
De certa maneira, essa transformação abre um novo leque de atuação para o profissional de Direito, que pode se alinhar a outros profissionais de tecnologia, criar soluções inovadoras ou mesmo dar a escala aos atuais serviços. “E tudo isso graças às lawtechs”, afirma Castro, da OAB.
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